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PAPER 111: Projeto de País (EU SOU BRASIL!!!)

Tema: “Um projeto para o País”(2)

“A lei é poderosa; mais poderosa porém é a necessidade.”
Goethe

O DEBATE:

IRANY NOVAH MORAES – Conheço de longa data as suas ideias a respeito de ações para mudar esse ‘status quo’ no qual vivemos e que parece se agravar cada vez mais. Mas ouvi uma expressão nova, que é ‘perda de carga’.. Acho que é uma visão do engenheiro para se referir ao violento rombo que temos. Na verdade, o dinheiro não chega ao destino não porque não foi encaminhado para o destino, mas porque foi se desgastando pela mão inoportuna que costuma desviá-lo. É uma coisa muito séria, quase que precisamos de um ministério para cuidar disso. Mas de qualquer maneira a gente sente que, depois que se tirou um presidente, as coisas mudaram. Todas essas ideias suscitam debates enormes. O positivo é que nasce uma conscientização. Não acredito que nasçam as ideias, mas nasce uma conscientização do povo, e quanto mais se debater melhor.

Uma coisa que preocupa são as penas. Nos países asiáticos, as lojas expõem na calçada aparelhos eletrodomésticos 24 horas por dia e não há roubo, porque lá tanto faz o indivíduo roubar um radinho de pilha como assaltar um banco. Ele é executado quinze dias depois de correta e amplamente julgado. Parece que há uma diferença nisso. Aqui, pelo que sei, o único preso de todo esse contexto é o PC Farias.

AVELAR – O senhor disse uma coisa muito importante. A ideia é criar um ministério para cuidar disso. Itamar teve essa ideia de criar uma secretaria para cuidar da corrupção. Não podemos mais incorrer nessa falha. Temos que trabalhar para propiciar o aprimoramento das instituições. Quem vai resolver o caso da corrupção e da impunidade no Brasil é o Poder Judiciário. Nós sugerimos em nossa proposta de Constituição uma nova estrutura para o Poder Judiciário, também descentralizada, de tal sorte que o estado seja a instância máxima das decisões nos processos. Não há recurso para Brasília.

MOACIR VAZ GUIMARÃES – Três aspectos me chamaram atenção. Primeiro seu anteprojeto de Constituição Brasil-Nação, com apenas 99 artigos. Comparei com as Constituições brasileiras que incluem matéria de lei ordinária e até de decreto. A Constituição deve ser pura e simplesmente um elenco de princípios. Nossa última Constituição é um modelo de atentado à própria técnica legislativa, sem falar nos atentados ao próprio Direito Constitucional.

Outro aspecto que me chamou a atenção foi o destaque que o senhor deu ao fato de que somos uma federação no papel, mas na realidade sempre fomos uma república unitária. Até porque, dentro do Direito Constitucional, na clássica definição de federação os poderes originários pertencem às unidades federadas e apenas os poderes remanescentes ficam para a União.

Na parte da educação, que me toca de maneira muito especial, ouvi também em sua palestra colocações com muito senso de responsabilidade. O grande problema brasileiro é educação, considerada ‘lato sensu’, não só ensino, mas educação. Eu até diria que antes de mais nada precisaríamos nos perguntar de que projeto educacional o Brasil precisa, porque não temos um projeto educacional. Temos vivido sempre de iniciativas isoladas e conflitantes, num mercado de influências e sucessivos erros.

Esse projeto nacional de educação, como foi muito bem delineado na sua palestra, só pode ser concebido a partir de uma verdadeira federação. Temos que ver qual é a realidade brasileira, temos que preparar não só a mão-de-obra qualificada, dando ênfase ao ensino fundamental e profissionalizante, mas também cuidando do aprimoramento de nossas elites, para então, através da solução do problema da educação, solucionar todos os demais que dele derivam.

AVELAR – Está em tramitação a aprovação de uma lei de diretrizes e bases da educação nacional. Na estrutura de Estado que nós temos hoje, qualquer lei que se aprove tem que se conformar com essa estrutura de Estado. Assim, a lei vai perpetuar o centralismo das decisões educacionais, ao invés de descentralizar e permitir que as peculiaridades locais, a cultura local se manifeste e opere na formação do homem naquele local.

HÉLIO DE BURGOS-CABAL – A problemática brasileira é extremamente desafiante e para identificar os termos dessa equação há vários caminhos. O Projeto Brasil-Nação se assentaria em dois pressupostos: a descentralização da competência e recursos do atual sistema federativo brasileiro e a reforma do Estado visando o aumento da sua eficiência, através da ação comunitária resultante de uma redistribuição de funções e encargos do sistema federativo brasileiro.

Todavia, há aqui a meu ver um antagonismo entre o idealismo até certo ponto ingênuo e a realidade brasileira. O que se pretende com a redistribuição? Dar autossuficiência financeira ou administrativa aos 5 mil municípios, dos quais apenas uma íntima parte tem capacidade para isso. Sem falar dos estados, dezessete estados no Brasil dependem do óbolo da União, não tem auto suficiência financeira nem administrativa. Seria uma irrealidade então darmos recursos a qualquer coisa da ordem de 4 mil municípios que não tem nenhuma capacidade de auto suficiência administrativa.

Creio que há vários caminhos para o desenvolvimento brasileiro. Um, por exemplo, seria a atração de capitais e tecnologia do exterior. Aparentemente, no Projeto Brasil-Nação o peso que se dá a essas iniciativas é menor. O maior seria o auto esforço comunitário, se bem entendi. Vejamos, todavia, em que bases essa realidade se assenta. Quando o Brasil foi descoberto, Portugal tinha apenas 1 milhão de habitantes, e por setenta anos foi considerado, com a Espanha, a superpotência da época. Foi um lapso da História, um período brevíssimo, em que Portugal teve coragem e a visão de desvelar o mundo para a Europa, mas não demonstrou a capacidade, como a Inglaterra posteriormente, a própria Holanda e a França, promover o desenvolvimento dessas áreas por eles descobertas. De maneira que no Brasil, mercê dessa deficiência e dessa carência, a população foi sempre escassa. Ela foi educada segundo os valores e crenças da cultura ibérica. No caso português, teríamos o privilégio como valor máximo da cultura ibérica e, por força da convergência da cultura afro-indígena, a magia. De maneira que com esses dois valores, população escassa, nenhum capital e tendo apenas como valores e crenças que determinam o comportamento dos indivíduos o privilégio e a magia, pelo tempo afora, durante 300 anos, ficamos confinados a esse círculo vicioso de deficiência e carência.

Posteriormente desenvolvemos uma curiosa política com relação ao resto do mundo, que é no fundo também uma derivação da cultura ibérica, particularmente de Portugal. A visão de Portugal com relação ao mundo era de temor, prudência, cuidado, comedimento. Foi isso o que nós herdamos e pusemos em prática durante o século 19.

Mas a partir do final do século até 1970, o Brasil percorreu uma trajetória gloriosa, crescemos à proporção de 7% ao ano. É claro que dentro daquele modelo histórico para o qual gostaria de chamar a atenção: escassez de população, formação defeituosa da população (estou falando do ponto de vista do conhecimento), instituições débeis, frágeis. É um milagre o Brasil ter chegado aos nossos dias com esse aspecto de progresso de uma ordem relativa e de uma eficiência mínima.

Agora é preciso nos afastarmos desse fundo de quadro histórico para nos entranharmos na atualidade. O que existe no momento? O Brasil, nas últimas décadas, foi vítima de comoções sociais cataclísmicas, teve a sua população aumentada quatro vezes em quarenta anos. Mas 70% da população rural iletrada, pobre e doente foi transferida no maior movimento de migração interna da Terra. Então é claro que, em função da incapacidade do Estado, essa população se marginalizou completamente.

Depois houve a intervenção do Estado. Na década de 30 houve uma visão da problemática brasileira que considerava o recurso a um instrumental utópico, buscando promover o Brasil por meio da ação empresarial do Estado. Não houve um projeto nacional de industrialização, como no Japão. Nós nos industrializamos em virtude de um acidente da História. Se em 1930 não houvesse a grande Depressão, que nos impediu completamente de continuar com o modelo de troca de bens primários por bens manufaturados, possivelmente estaríamos ainda na mesma situação que naquela década.

Concordo com o senhor, o Estado realmente precisa ser reformado. Ele foi atacado de uma disfunção múltipla. Como os médicos dizem, quando há falência múltipla dos órgãos, sobrevém a morte. Nós estamos neste instante ameaçados de uma falência múltipla, nada está funcionando, há uma paralisia total.

AVELAR – Embaixador, suas reflexões são enriquecedoras. Nós advogamos a tese de que devemos convocar já uma Assembleia exclusiva para fazer a revisão constitucional, porque achamos que não é o Congresso Nacional o fórum adequado. O Legislativo por acaso vai reformar o Judiciário, vai reformar o Executivo? Não admitir uma exclusiva para a abordagem global da solução de que precisamos agora é perpetuar a situação em que estamos hoje no Brasil.

JÚLIO NAKAGAWA – Entendemos que a estrutura organizacional do País realmente é um dos pontos básicos de todo o desenvolvimento. Penso que o Brasil é privilegiado. Outro país não sobreviveria a tamanha inflação e a essa série de coisas. Mas há barreira muito séria para se corrigir a situação: encontrar homens competentes em cada setor administrativo. Um dos maiores problemas na descentralização é o corporativismo, que já está sedimentado em todos os setores. Mesmo que uma determinada pessoa tenha boas ideias e queria dar a sua contribuição administrativa, fica difícil porque muitas vezes os próprios partidos políticos impedem a entrada de pessoas que desejam participar. Isso acontece da mesma forma na universidade. Não deveria haver uma preliminar que pudesse solucionar em princípio esse problema do corporativismo?

AVELAR – Quero me reportar a uma afirmação que já fiz: existem pessoas capazes na sociedade. Temos que ter uma estrutura tal que atraia essas pessoas. Por exemplo, o sistema americano capta os talentos na sociedade.

Qual é a solução para o corporativismo? Muitas vezes ficamos nos digladiando contra determinados efeitos, sem procurar pesquisar solução para as causas. O voto distrital mata o corporativismo. Com voto distrital dificilmente conseguem-se eleger petroleiros no estado inteiro, pode-se eleger um petroleiro lá na área da Petrobrás, naquele local que representa aquele distrito.

Esse anteprojeto de Constituição, modéstia à parte, nós o concebemos, e contratamos o Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, do professor Celso Bastos, para dar base jurídica e a técnica constitucional a nossas ideias. Vejam uma questão importante no Brasil e que é causa de corrupção: o governo não paga, não cumpre os seus compromissos. Por isso, as empresas mais fracas não podem entrar na concorrência. O governo está distorcendo assim as condições de competição de mercado. Como fator importante para eliminar essa fonte de corrupção, criamos um artigo que possibilita a qualquer cidadão, mediante as condições do Judiciário, requerer a intervenção no ente federativo, seja o estado seja a prefeitura. Da mesma forma o governo dos estados intervém nos municípios. Aí perguntariam: e quem vai intervir no governo da União? É por isso que o governo da União não vai fazer investimentos, só vai administrar o País. Ele não vai comprar nada, não vai contratar nenhuma obra, não vai contratar nenhum professor e assim por diante. Então todo o conjunto tem uma coerência para resolver essas questões.

EDUARDO SILVA – Cada vez que ouço essa exposição fico mais convencido de que o diagnóstico está certo. O nosso trabalho sempre foi visto pelos estrangeiros como muito mal organizado e muito mal dirigido. Outra observação que se vê até um livro de viajantes é que aqui sempre tivemos uma tendência pelos superlativos para resolver os problemas. Tudo tem que ir ao Supremo. No caso da Justiça, ao Supremo Tribunal; no caso do Legislativo, o que não está na Constituição não vale. E o que não é decidido pelo presidente, ou imperador, parece que não tem valor. Sim, acho que ainda vivemos num sistema imperial, nosso presidente é mais um imperador do que um presidente.

Nós temos que mudar isso, não há dúvida. Mas como vamos fazer para colocar em prática esse mínimo de racionalidade? A única forma de conseguir mudar essa estrutura do País rapidamente seria através de uma Constituinte exclusiva. Mas eu também penso que as chances de existir uma Constituinte exclusiva são muito pequenas, praticamente desprezíveis, apesar de todo o esforço que se possa fazer.

Então chego à conclusão de que o único meio de impor rapidamente a mudança que queremos é o aumento da desgraça. Vamos ter que esquecer de uma vez o governo estadual. É o que já está se passando no Rio de Janeiro, por exemplo.

Esse renascimento terá que vir de algum modo. O que estamos vendo em algumas cidades do interior de São Paulo, por exemplo, é que nas áreas de educação e saúde estão aparecendo consórcios entre a prefeitura e lideranças da sociedade para construir hospitais e garantir o atendimento à população. Isso é a coisa da realidade. Então já não estamos mais esperando nem Constituinte exclusiva nem reforma da Constituição nem outra iniciativa do Estado. Seria lógico começarmos a tentar uma organização a partir daí, mas a verdade é que na prática essas soluções também estão distantes.

Vamos examinar o quadro da morte de Getúlio Vargas, em 1954, 1 milhão de pessoas no enterro dele. Naquela época o País era mais politizado. Por quê? Eram menos pessoas, a elite, os políticos, os homens com conhecimento representavam um percentual maior em relação à população toda. Hoje a relação é muito pequena.

Afirmar que a Constituinte exclusiva é impossível poderia ser juridicamente correto se o País estivesse em normalidade, mas minha concepção é de que ele não está em normalidade. Não trabalhamos com hipótese de uma Constituinte exclusiva para os próximos meses. Trabalhamos com a hipótese para os próximos dez anos. Segundo os cientistas políticos, todas as exclusivas se viabilizaram em situação de emergência política de ruptura. Acho que estamos já na ruptura, mas a emergência política do conflito da classe dirigente e dos políticos em si pode ocorrer.

Então não penso que nos próximos três meses vá se fazer alguma coisa. Acho que não tentar a administrar o caos. Também acho que temos que estar prevenidos, na sociedade temos que debater um projeto de Constituição, uma concepção de Estado, um objetivo. Na hora emergencial que ocorrer já estará pronta a solução, já está na prateleira, é pegar e apresentar. Vamos nos lembrar das crises de 61, aquela crise do afastamento de Jânio e assunção de João Goulart. Ninguém tinha solução. Sacou-se da algibeira um remendo que dois anos depois caiu.

MARCOS CINTRA CAVALCANTI – São temas de extrema importância, com os quais concordo em tese. Mas tenho algumas dúvidas. A primeira se refere ao federalismo. Eu me pergunto se a ênfase em criar um verdadeiro federalismo no Brasil não seria uma fantasia, uma vez que nós sempre vivemos num Estado unitário. O federalismo no Brasil não seria uma fantasia, uma vez que nós sempre vivemos num Estado unitário. O federalismo no Brasil é uma criação absolutamente cerebrina, a partir da proclamação da República, uma cópia do modelo americano sem nenhuma base factual, cultural, sem nenhuma base econômica. Vejo uma federação como uma reunião de entes independentes, com poderes e estruturas de poder próprios, primários, oriundas deles mesmos e que exigem ao mesmo tempo um mínimo de uniformidade, um mínimo de condições de sobrevivência e de autonomia política, econômica, administrativa e assim por diante. Diz o conferencista que bastaria que os entes federados tivessem o tamanho e a conformação que dessem essa autonomia e condição de administração própria. Mas eu pergunto: num país como o nosso, que formato de federação teríamos? Acredito na descentralização administrativa e na especialização de determinadas atividades. Mas não acredito na federação como uma estrutura do Estado nas condições brasileiras, embora acredite na descentralização, na especialização e consequentemente na geração de condições administrativas de execução de projetos.

Ter condições para gerar estruturas federadas com homogeneidade, com um mínimo de condições próprias de geração de recursos, atividades administrativas e assim por diante, me parece exigir prazo muito longo.

A segunda dúvida diz respeito a como fazer as reformas. Passamos por uma crise e eu diria que estamos muito próximos da ruptura. Já temos consciência plena da necessidade de reformas. No entanto, perdemos a oportunidade constitucional de fazer essa revisão no final de 93 e início de 1994. Como viabilizar isso? Como é que nós, da sociedade civil, poderíamos fazer isso rapidamente? Não podemos aceitar um projeto de dez anos para o País, precisamos fazer um projeto de um ou dois anos. Como viabilizar essas reformas o mais rapidamente possível?

AVELAR – A primeira parte da pergunta é se essas entidades teriam condições econômicas de ser viáveis financeiramente. Na atual estrutura, certamente não são. Nossa proposta (é uma das seis propostas que apresentamos na revisão constitucional) é que haja descentralização de bens. Os estados seriam os proprietários do potencial hídrico, dos bens sob o subsolo; a energia petrolífera pertenceria ao estado onde existisse.

Quanto à viabilidade, gostaríamos de implantar esse projeto ou de ver soluções para o País agora. Tanto é que trabalhamos assiduamente para preparar propostas para a revisão constitucional. Atuamos noventa dias dentro do Congresso e constatamos a inviabilidade. Em fevereiro decidimos vir embora. Ficaram até maio ainda em festa, no faz-de-conta da revisão. Acho que é preciso uma Constituinte exclusiva, pela concepção das decisões que tem que ser tomadas.

Quanto a nossa cultura de quatro séculos de Estado unitário, diria que já estamos há um século na República. Como não mudamos ao passar para a República, estamos mastigando aquelas concepções portuguesas a que o embaixador se referiu muito bem. Penso que as unidades não têm que ser homogêneas, elas têm que ser desiguais mesmo. As regiões têm que ser desiguais entre si. Querer resolver os problemas das desigualdades regionais é concepção soviética.

A pergunta seria a seguinte: mas e os estados do nordeste, que são pobres? Quem disse que são pobres? Quem sabe se lá não está um Japão adormecido? Enquanto não adotarmos uma concepção federalista (é a nossa concepção) mais definida, não poderemos saber se o nordeste deve continuar sendo mantido pelo sul. Eles continuarão a dizer que São Paulo, o sul, explora o nordeste. Essa celeuma só toma tempo nosso. Temos que partir do princípio elementar de que é em casa que resolvemos os problemas. Se o município não pode ser município, não vai ser município. O estado tem que se viabilizar também.

NEY LIMA FIGUEIREDO – Todos estamos fartos de saber que o Brasil é um país com um Estado forte e uma sociedade fraca. Então todas as iniciativas como essa do Brasil-Nação são louváveis.

Gostaria de fazer uma ponderação e uma pergunta. O Brasil vive um momento único desde 45, Fernando Henrique não é um presidente comum, é um dos intelectuais mais capacitados do Brasil. É um presidente que não tem o direito de errar. Primeiro porque ele sabe dos nossos problemas. Segundo porque está cercado do que existe de melhor no País.

Agora a pergunta. Não pude examinar o seu Projeto Brasil-Nação, mas me preocupa um ponto que não sei se está abordado aqui. É o problema partidário. Não se pode ter democracia com essa pluralidade partidária, com partidos que não representam nada e com o corporativismo. Quando a gente fala de democracia e Congresso forte, temos que falar em partido. Qual é a colocação do Conselho Brasil-Nação no que se refere à reforma partidária?

AVELAR – Em nosso anteprojeto nos limitamos ao sistema político, voto distrital, voto facultativo, periodicidade dos mandatos. Achamos que deve ser da lei complementar a concepção da estrutura partidária. Deve ser como na Alemanha, com limitação da quantidade de partidos com acesso a cargos majoritários. É aberta a possibilidade de criação de partidos, mas só os cinco ou os oito maiores tem a possibilidade de lançar candidatos à presidência da República, governo estadual, prefeituras e assim por diante.

AMÉRICO OSWALDO CAMPIGLIA – Logo de início, o conferencista falou de um problema que eu colocaria como a vocação política do Brasil. Esse problema, como o senhor disse muito bem, ocorre quando se põe o imediatismo contra o projeto. O projeto tem uma acepção muito ampla, não é um projeto específico, como ficou bem claro na sua exposição.

Isso tem certa semelhança com a distinção que se faz entre duas escolas econômicas o monetarismo e o estruturalismo. Essa similitude vem a propósito do comportamento dos nossos políticos em favor do imediatismo. Esse imediatismo vem do tempo da República, acho que até do Império. Neste país as medidas que são tomadas, seja para corrigir certos problemas, seja para projetar algo para o futuro, visam sempre o interesse imediato. O político evidentemente precisa ter um retorno imediato.

Ninguém quer cuidar do futuro do País, todos querem o imediato, como o senhor disse muito bem. Nesse contexto, vejo a ênfase que o presidente dá à questão da reforma tributária. A política fiscal também responde com muita ênfase a esse imediatismo, uma vez que ela envolve novos impostos, aumento de alíquotas, empréstimos compulsórios e emissão de papel-moeda. Então recorre-se a esse instrumento que é a política monetária para resolver todos os problemas que temos neste país. Isso é frontalmente contrário a tudo quanto foi exposto na sua palestra.

Quero acentuar também que o Brasil hoje, como está amplamente divulgado, tem uma reserva cambial da ordem de US$ 42 bilhões. Qual é o objetivo do governo em manter essa reserva e não utilizar esses recursos, por exemplo, para promover a ampliação da capacidade produtiva do País? Atacar a economia pelo ‘supply side’, como fizeram os americanos no governo de Reagan? É com isso que vai se proporcionar produção de riquezas, bens e serviços, é com isso que se vai incentivar a oferta de empregos, a poupança, os novos investimentos que são parte integrante de qualquer processo desenvolvimentista no aspecto econômico. Ou aproveitar talvez a metade disso para pagar toda a dívida externa brasileira, cujo valor de face lá no exterior está entre 15% e 20%. É uma coisa discutível, mas parece que a intenção do nosso governo é manter esses US$ 42 bilhões, porque evidentemente deve dar muito prazer aos políticos administrar essa verdadeira montanha de dinheiro.

Para finalizar, acho que o projeto se justifica, sem dúvida nenhuma, pelo menos como uma diretriz futura. Mas acho também que já temos o exemplo de que a iniciativa privada no Brasil, a despeito de todos os contrários, vem mantendo o desenvolvimento do País. Então entendo, em favor desse tema que foi brilhantemente abordado pelo engenheiro, que é preciso cuidar da iniciativa privada quando se fala de mercado interno. Não é cuidar da política, embora a política possa ter influência nessa instituição.”

A democracia fundada no Estado de Direito e na cidadania não é uma estação de chegada, mas uma maneira de viajar, visando desenvolvimento econômico, político, cultural e social para transformar o Brasil na melhor nação do mundo para se viver bem.

Personalidades autoras de artigos e citações neste “PAPER”:

– Abram Szajman, presidente da Fecomércio SP;
– Johan Wolfgang von Goethe, estadista alemão, escritor destacado da literatura alemã e romancista europeu;
– Marina Silva, ex-Ministra do Meio Ambiente, ex-senadora;

Debatedores e participantes da palestra:

– Américo Oswaldo Campiglia, ex-professor da POLI-USP, economista e administrador de empresas;
– Eduardo Silva, engenheiro, POLI USP
– Hélio de Burgos-Cabal, ex-embaixador
– Irany Novah Moares, médico e professor da Faculdade de Medicina USP
– Júlio Nakagawa, engenheiro agrônomo, ESALQ USP
– Marcos Cintra Cavalcanti, economista, professor da FGV, ex-secretário da Receita Federal
– Moacir Vaz Guimarães, advogado, jornalista, educador
– Ney Lima Figueiredo, cientista político e consultor

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