PAPER 126: Projeto de País (EU SOU BRASIL!!!)
Tema: “Eleições 2022.” (3)
“Não há instituição humana que não tenha os seus perigos. Quanto maior a instituição, maiores as chances de abusos. A democracia é uma grande instituição e por isso mesmo está sujeita a ser consideravelmente abusada. Mas o remédio não é evitar a democracia e sim reduzir ao mínimo a possibilidade de abuso. (…)”
Livro: As palavras de Gandhi, Ed. Record
O cientista político e sociólogo Bolivar Lamounier traz contribuição significativa ao debate público necessário de ocorrer no Brasil, na antevéspera das eleições de 2022.
Sua lúcida contribuição foi veiculada pelo jornal “O Estado de S. Paulo” em 14/08/2021, na página A2, sob o título “Reflexões sobre um país invertebrado”.
Considerando a grande afinidade entre a sua visão e as propostas com as que têm sido divulgadas pelo Conselho Brasil-Nação, decidimos transcrever neste “PAPER” o mencionado artigo, na íntegra, assim incorporando-o ao nosso acervo documental a respeito.
A nosso ver a orientação essencial da sequência de governos brasileiros de agora em diante, iniciando-se pelos que vierem a ser eleitos em 2022 para o governo federal e os sub-nacionais, conjugados com os municipais já no exercício de mandatos, deve ser a de perseguir com assertividade e determinação, compromissadas nos processos eleitorais, a “Redução do custo do Estado e a elevação do patamar do PIB”.
A visão e as propostas do cientista político Bolivar Lamounier são os primeiros e necessários passos a partir de agora.
Não lograremos êxito sem abordar, como proposta aceita e aprovada pela elite brasileira, na conceituação do articulista em tela, o enfrentamento da superação dos obstáculos que têm impedido a realização do Desenvolvimento Econômico brasileiro, caminho seguro e único para a redução da POBREZA visando sua eliminação, da desigualdade social e econômica, e viver a sociedade em liberdade plena e em regime sólido de Estado democrático de direito. Por que o Brasil abandonou a agenda do Desenvolvimento Econômico, nas últimas quatro décadas?
A seguir o artigo do cientista político Bolivar Lamounier:
“Reflexões sobre um país invertebrado
Somos desprovidos de qualquer travejamento que confira sustentação às instituições formais
Bolívar Lamounier, O Estado de S. Paulo – 14 de agosto de 2021
Só os muito obtusos têm o direito de subestimar a gravidade dos males que a imposição de uma ditadura traria ao Brasil. A esses é também dado o direito de ignorar que Jair Bolsonaro – coadjuvado por um número decrescente, mas ainda expressivo, de bolsonaristas fanáticos – não pensa noutra coisa.
Os demais podem ser classificados em dois grupos: os democratas e um grupo amorfo, formado por bolsonaristas a caminho da desilusão e indiferentes. Os democratas sabem perfeitamente o que têm de fazer: protestar contra os desatinos diários do inquilino do Planalto e trabalhar ativamente pela formação de uma candidatura capaz de se opor aos extremos populistas na eleição de 2022.
Isto posto, penso que a sustentação do regime democrático está na dependência de dois fatores. O primeiro é, obviamente, o centro. A polarização eleitoral de 2018, cujos efeitos foram agravados pela pandemia, esmagou os partidos, já de si débeis, que tentavam ocupar esse espaço. Em médio prazo, é imperativo reconstituir tais partidos, mas o momento que vivemos é uma emergência. O que ela exige é uma solução rápida e eficaz: escolher o candidato certo para a eleição, tendo em mente que já estamos na contagem regressiva. Reconstituir todo o nosso esfarelado sistema de partidos não é algo que se possa efetivar da noite para o dia.
Dentro desse quadro, o segundo fator que me propus discutir adquire importância singular, pois diz respeito ao longo prazo, mas precisa ser iniciado o quanto antes. Refiro-me à própria coluna vertebral do sistema político.
Até os anos 50 do século passado, ou seja, no imediato após-guerra, demos por assentado que uma elite relativamente exígua e o texto constitucional adotado em 1946 cumpririam a função básica de vertebrar o regime democrático. Nosso principal erro foi subestimar a corrosão do sistema político pelo antagonismo getulismo x antigetulismo, das discordâncias referentes à estratégia de crescimento econômico e pelo onipresente veneno da guerra fria.
No momento atual, urge-nos encarar a realidade com mais sobriedade e lucidez. Não só os problemas que temos pela frente se agigantaram, mas as ameaças à democracia são proferidas, às vezes de forma explícita e sem nenhum pudor, por titulares de funções públicas elevadas. Entre os antídotos a considerar, peço licença para me concentrar na questão da elite. Uma elite exígua e limitada à esfera política, como a que povoava nossas mentes nos anos 50 do século passado, hoje, manifestamente, não é possível nem desejável. Somos agora um país muito maior e com carências dantescamente mais graves. Digamos, abreviadamente, que a governabilidade se tornou um problema agudo, mesmo na hipótese de voltarmos brevemente a tempos normais. O contraponto à nossa antiga imagem da elite é a mistificação populista do “povo”, uma entidade amorfa, indefinível, como convém a esse gênero de política. O líder populista tipicamente apela à totalidade do “povo” para se legitimar e convoca seus militantes fanáticos para ameaçar as instituições democráticas.
A verdade é que democracia alguma jamais funcionou a contento quando se deixou arrastar para um desses extremos. Precisamos de mais convicção democrática e mais envolvimento e participação, mas a convocação que nos cumpre fazer é aos possuidores de recursos (resource owners), vale dizer, a todos os que detenham renda, riqueza, escolaridade, capacidade de argumentação e até, simplesmente, tempo, disponibilidade de tempo, recurso sem o qual um cidadão pouco pode fazer pela vida pública de seu país. Em números, os resource owners distam muito do “povo” dos populistas, mas são muitas vezes mais numerosos que a elite que tínhamos em mente no século passado.
O que venho de expor não é uma alternativa a qualquer das questões de substância que têm sido consideradas em nosso debate público. Não é um substituto para a reforma política. Não dispensa alterações constitucionais que impeçam os criminosos de colarinho branco de se refugiarem atrás do “trânsito em julgado”. É, isso sim, um apelo a um sujeito real, de carne e osso, que poderia estar efetivamente presente nas trincheiras de defesa da democracia, mas não encontra forma de o fazer, dadas a irrelevância e o caráter oligárquico de nossos partidos políticos.
O problema, como o vejo, é que passamos décadas e décadas vituperando “as elites”, quando, na verdade, somos um país rigorosamente desprovido de elites, ou de qualquer travejamento que confira substância e sustentação às instituições formais. Por difusa e dispersa que seja, a comunidade dos possuidores de recursos pode vir a ser o anteparo sem o qual jamais teremos uma reforma política séria. Esta constatação tem tudo que ver com nosso futuro econômico e social. Não vejo possibilidade de o Brasil retomar o crescimento econômico em bases sustentáveis sem uma reforma política abrangente e profunda. E não me parece plausível que o Congresso Nacional venha, sponte sua, a realizar tal reforma.
SÓCIO-DIRETOR DA AUGURIUM CONSULTORIA E MEMBRO DAS ACADEMIAS PAULISTA DE LETRAS E BRASILEIRA DE CIÊNCIAS”
CONCLUSÃO:
A manifestação acima do cientista político, que se junta às de diversos outros pensadores, muitos deles citados em nossos “PAPER”s, principalmente ao longo dos últimos anos, convoca os brasileiros responsáveis, elegantemente classificados no artigo como “possuidores de recursos (resource owners) “.
Eles estarão , no mínimo, em defesa de seus próprios ativos patrimoniais quaisquer que sejam os aspectos a considerar, os materiais, os intelectuais, os de integridade e segurança familiares, os sanitários (saúde), os civilizacionais, e outros; “precisamos nos emancipar para, então, salvar nosso país”, dito por Abraham Lincoln em 1862, ainda válido, adaptado a nossa situação.
Advertência importante nos legou Oswaldo Aranha em 1947, pois o que vivenciamos atualmente é questão de sobrevivência: “O Brasil, se quiser sobreviver, não poderá cruzar os braços, indolente e resignado, esperando dos céus…”
Não basta que “O Brasil terá eleições e seus resultados serão respeitados”, e que (…) “A sociedade brasileira é garantidora da Constituição e não aceitará aventuras autoritárias.” A elite brasileira tem de avançar na prática constitucional da democracia representativa e do Estado de direito, buscando a superação das disfunções de nítida precariedade institucional dos partidos políticos, a começar por não tolerar desfiliação ou mudança de filiação partidária após eleições, de “titulares de funções públicas elevadas”, sem a perda do respectivo mandato. Por que limitar a fidelidade partidária aos deputados?
A propósito, ver “PAPER”124, pag. 4/4:
“O ponto de inflexão pode ser agora, ante a magnitude, em extensão e profundidade da situação de crise atual do País, se nos dispusermos a sustar e impedir os costumeiros procedimentos de “tapar o sol com peneira”, de “deixar como está para se ver como fica”, enfrentando a realidade para tomar as decisões certas e eficazes, e inadiáveis.
Ao procurar na militância política por articulações apenas político-eleitorais, para as eleições de 2022, simultaneamente estabelecer bases mínimas de organização e comprometimento legal de um novo ordenamento político-partidário brasileiro dando segmento à decisão já tomada “Cláusula de barreira”, por obra da atitude dos líderes em todos os setores, que vierem a assumir suas responsabilidades , antes de tudo – no mínimo — para proteger seus ativos, independentemente de serem ou não políticos – os políticos, os econômico-empresariais, os da sociedade civil, os religiosos, os professores – todos são responsáveis, sejam na ação ou na omissão.”
A democracia fundada no Estado de Direito e na cidadania não é uma estação de chegada, mas uma maneira de viajar, visando desenvolvimento econômico, político, cultural e social para transformar o Brasil na melhor nação do mundo para se viver bem.
Personalidades autoras de artigos e citações neste “PAPER”:
. Abraham Lincoln, 16º presidente dos Estados Unidos
. Bolivar Lamounier, sociólogo e cientista político
. Oswaldo Euclides de Sousa Aranha, político, diplomata e advogado
Mahatma Gandhi – Líder político e religioso indiano (1869-1948)