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Brasil explora na floresta minerais ‘do futuro’ que ajudarão a reduzir emissões

Tecnologia de energia limpa usa mais lítio e cobre do que a baseada em combustível fóssil; País tem potencial, mas ainda precisa avançar nas pesquisas.

Por Beatriz Bulla, Luciana Dyniewicz, O Estado de São Paulo, 28/04/2024

O painel do pequeno saguão do aeroporto de Parauapebas, no sudeste do Pará, mostra quatro voos vindos de Belo Horizonte para cada aeronave que chega de outra cidade. O vai e vem é de trabalhadores que construíram a carreira na extração de ferro e ouro em Minas Gerais e migraram para o que promete ser um dos polos da mineração brasileira na era da transição energética.

A existência de minério em Carajás não é novidade. Mas, na última década, a região deu um salto em torno de uma nova riqueza: o cobre, um dos minerais do futuro. Encravada em área de floresta amazônica está a mina do Salobo, da Vale, uma das apostas do Brasil para se colocar entre os principais fornecedores de minério para energias limpas e se posicionar como um protagonista global na agenda de economia verde.

Um mundo que busca reduzir suas emissões de carbono precisará de um aumento significativo na mineração, dado que as tecnologias de energia limpa demandam mais minerais do que as baseadas em combustíveis fósseis. Plantas de energia eólica e solar vão precisar de recursos minerais, assim como baterias e linhas de transmissão, que terão de ser reforçadas com o aumento da demanda por energia elétrica.

Para substituir as frotas de carros e mudar a cara do transporte, os minerais também serão elementos críticos. Enquanto um veículo movido a gasolina leva de 15 kg a 20 kg de cobre em sua composição, um elétrico precisa de algo entre 60 kg e 83 kg.

Parece um contrassenso ter de aumentar uma atividade com impactos ambientais significativos para reduzir as emissões, mas, segundo o professor da Universidade de São

Paulo (USP) Luis Enrique Sánchez, que trabalha com mineração e meio ambiente, isso será necessário. “A comparação é difícil, porque os componentes do ambiente afetados são diferentes, mas diminuir o uso de combustíveis fósseis é urgente porque o impacto dele no clima é irreversível.” Pesquisas e ações para reduzir o impacto da mineração, no entanto, terão de ser reforçadas, além da reciclagem de metais como o cobre.

O LÍTIO DE NAZARENO. Além do cobre – que é um ótimo condutor de energia e, portanto, será usado intensivamente em carros elétricos e na distribuição de energia –, o lítio é outro mineral que o Brasil tem e que será essencial na economia verde. A cerca de 70 quilômetros da histórica São João del Rei (MG), Nazareno, uma cidade com pouco mais de 8 mil habitantes, abriga a primeira mina do País a exportar lítio para a fabricação de baterias de carros elétricos.

Em 2018, a AMG Brasil, uma subsidiária da companhia holandesa AMG, passou a produzir e vender no mercado internacional concentrado de lítio, uma das principais matérias-primas da transição energética. Agora, novas companhias – como a brasileira Sigma Lithium, a americana Atlas, a australiana Latin Resources e a canadense Lithium Ionic – estão se instalando em uma região mais ao norte de Minas Gerais, no Vale do Jequitinhonha, no que já ficou conhecido como “vale do lítio”.

Os anúncios de exploração indicam que a produção brasileira de lítio vai passar de 10 mil toneladas em 2022 para 100 mil até 2030. Hoje, a produção de lítio está em linha com as reservas conhecidas do material. O País responde atualmente por 1% da oferta global do produto e tem o equivalente a 1% das reservas.

A mina em Nazareno está em expansão. Com investimentos de US$ 50 milhões (cerca de R$ 256 milhões), uma nova linha de processamento de lítio está sendo instalada no local, o que ampliará a capacidade em 45% e reduzirá o tempo em que será possível explorar a mina de 23 para 18 anos.

BRASIL X MUNDO. Em 2021, o US Geological Survey’s Mineral Commodity Summary, um relatório do governo dos Estados Unidos estimava que o mundo tinha 86 milhões de toneladas de lítio. Em 2023, o número foi revisado para 98 milhões de toneladas. O mesmo relatório diz que “a segurança do fornecimento de lítio tornou-se uma prioridade máxima para empresas de tecnologia na Europa, nos Estados Unidos e na Ásia”.

A Austrália, sozinha, produziu 40,8% do lítio mundial em 2022, segundo o MineSpans, da consultoria McKinsey. Atrás vieram Chile, China e Argentina. Já o Brasil, segundo o mesmo ranking, vinha em quinto lugar, com 1,6% da produção mundial.

O mundo ainda corre o risco de não conseguir acelerar a oferta de materiais críticos para a transição energética de forma a responder às ambiciosas metas climáticas acordadas pelos países em fóruns multilaterais. Isso porque as minas demoram a sair do papel. Na mina da Vale do Sossego, no Pará, por exemplo, foram oito anos entre a pesquisa de viabilidade e o início da operação.

O Brasil não costuma aparecer nos relatórios globais de consultorias e governos quando o tema são os maiores produtores da América Latina de cobre e lítio. O Chile aparece na frente, mas a qualidade do minério chileno tem caído, conforme a idade das minas avança. A Colômbia é apontada como um país sul-americano onde o potencial não é totalmente explorado. Nos outros países da região, segundo analistas e investidores, não há estabilidade política e institucional, e a infraestrutura já existentes no Brasil permite ocupar essa posição rapidamente.

No Pará, o escoamento do cobre é feito de caminhão até Parauapebas, e de lá, de trem pela Estrada de Ferro Carajás até Ponta da Madeira, em São Luís do Maranhão, de onde parte para o mercado europeu. O rejeito, que é também a sobra do material mas já após o processo de beneficiamento, atualmente é colocado em uma barragem.

CÉU ABERTO. A mina do Salobo é um buraco a céu aberto de 300 metros de profundidade e 4 quilômetros de diâmetro, completamente cinza, em meio ao verde da floresta. A previsão é de que chegue a até 800 metros de profundidade. No entorno dos andares de pedra e areia por onde passam os caminhões que carregam o minério até a usina de beneficiamento estão também as pilhas de estéril – o que sobra no primeiro processo de extração do metal.

A Vale também trabalha na ampliação de suas minas no sudeste paraense – em um processo ainda mais acelerado que o da AMG. Foi há pouco mais de um ano, em dezembro de 2022, que a terceira usina do Projeto Salobo entrou em operação, para fazer o beneficiamento do cobre no local – após uma injeção de US$ 1,1 bilhão (R$ 5,6 bilhões). Em fase de aumento de produção, ela deve fazer a empresa ampliar a sua capacidade de produção de cobre de 24 milhões de toneladas para 36 milhões por ano.

“A intenção é colocar a empresa entre as maiores produtoras de cobre do mundo”, afirma Antonio Padovezi, chefe de operações da Vale Metais Básicos. Com esse objetivo e diante do aumento da demanda pelo produto, a multinacional separou, no ano passado, sua operação de cobre e níquel na subsidiária Vale Base Metals (VBM), avaliada em US$ 26 bilhões (R$ 133 bilhões) e considerada, agora, a joia da coroa pela empresa.

A mineradora começou a operar no sudeste do Pará em 1985, focada na exploração do minério de ferro. Em 2004, com a inauguração da Mina do Sossego, a multinacional estreou suas operações de cobre e atualmente conta com a maior mina do Brasil para a extração do minério, o Projeto Salobo.

“Provavelmente, no futuro, continuará como a maior mina de cobre do Brasil”, diz Antonio Schettino, diretor de operações da mina.

Enquanto países como Austrália e Canadá já mapearam quase todo seu solo e têm ciência do que podem produzir, o Brasil fez esse trabalho em apenas 4% de suas terras. “O lítio é um grande exemplo disso. Até poucos anos atrás, a gente praticamente não tinha lítio. Em quatro anos, triplicamos nossa oferta. O Brasil tem uma defasagem em pesquisa mineral”, diz o consultor Henrique Ceotto, sócio da McKinsey. De acordo com ele, o entrave é mais crítico em depósitos profundos, como de cobre e níquel.

OPORTUNIDADE. Se por um lado a falta de pesquisa é um obstáculo para o avanço da exploração mineral, por outro, é uma oportunidade para o País. Isso porque países como o Chile já têm toda sua área pesquisada.

Secretário de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia, Vitor Saback diz que o setor mineral “foi abandonado” por muito tempo. “Temos um ambiente regulatório muito frágil, uma Agência Nacional de Mineração (ANM) com 80 mil processos e precisamos ter instrumentos para saldar esse estoque e fortalecer a agência, pois lá é onde começa o caminho de um empreendedor do setor mineral.”

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