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Essa é uma eleição mais europeia, mas não pró-UE

Por Daniel Gateno, O Estado de S. Paulo, 09/06/2024

A União Europeia (UE) precisa de uma frente unida para lidar com seus atuais desafios, incluindo o avanço dos partidos de extrema direita e a guerra na Ucrânia, na avaliação da cientista política Nathalie Tocci, diretora do Instituto de Assuntos Internacionais da Itália, em entrevista ao Estadão. Segundo pesquisas, esses partidos devem obter um grande avanço no número de cadeiras nas eleições para o Parlamento Europeu que se encerram hoje, o que poderia ter um impacto para as principais pautas do bloco. Mas, segundo Tocci, ex-conselheira Especial dos altos representantes da UE Federica Mogherini e Josep Borrell, as fortes divisões entre esses grupos podem reduzir sua influência no Legislativo europeu. “Temos muito trabalho no contexto externo e precisaríamos de uma união no Parlamento Europeu para enfrentar tudo isso”, disse.

Quais as principais pautas dessas eleições?

As eleições para o Parlamento Europeu são muito peculiares. Antes, elas funcionavam como um referendo de cada governo nacional, sem tanto enfoque às questões europeias. Mas isso tem mudado e as pautas têm ficado mais europeias. Não porque os cidadãos sabem mais sobre os temas ou sobre o que acontece no Parlamento Europeu, mas porque existe uma consciência da importância da UE como modelo de governança. Com isso, a participação popular aumentou. Por outro lado, o projeto europeu se tornou mais polarizado e houve um aumento do apoio a partidos eurocéticos, de extrema direita. Se antes as pessoas que não gostavam da UE não votavam, agora elas fazem questão de ir às urnas, mesmo que seja para votar contra o projeto europeu. Essa é uma eleição mais europeia do que nacional de cada país, mas não necessariamente é pró-UE.

Como seria um Parlamento com uma grande quantidade de eurodeputados de extrema direita?

As pesquisas sugerem que de fato haverá um aumento de eurodeputados. Até agora, os partidos da extrema direita não tiveram tanta influência no Parlamento Europeu porque os partidos nacionalistas não são muito unidos, eles discordam em muitas questões. Eles não são muito bons em cooperação internacional e por isso não são efetivos. Mas isso pode mudar. Marine Le Pen (Reagrupamento Nacional) está tentando conversar com Giorgia Meloni (Irmãos da Itália) para que seus partidos trabalhem juntos. Se conseguirem, podem se transformar em uma minoria barulhenta no Parlamento. No contexto externo, um Parlamento de extrema direita seria bem ruim. Estamos com muitos problemas na Europa, com uma guerra no continente, além da crise climática, uma outra guerra no Oriente Médio, Donald Trump pode retornar à Casa Branca e não temos boas relações com o chamado Sul Global. Temos muito trabalho e precisaríamos de uma união no Parlamento Europeu, de uma frente unida.

Com a guerra na Ucrânia e a possível volta de Trump à Casa Branca, a Europa precisa gastar mais em defesa?

Não temos escolha. Temos de gastar mais em defesa e temos de continuar apoiando Kiev. A segurança da Ucrânia é importante para a segurança europeia. Temos que fazer mais pela nossa defesa.

A Otan enviará tropas para a Ucrânia?

Se chegarmos em uma situação catastrófica em que a Ucrânia esteja perto de perder a guerra, imagino que sim, a Otan poderia enviar tropas para a Ucrânia. Não acho que estamos nessa situação agora. O ponto que o presidente (Emmanuel, da França) Macron quis expressar (em entrevista à Economist) é que todas as possibilidades estão na mesa. Mas não vamos falar ao inimigo o que faremos ou não, isso não é inteligente.

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