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‘Talvez a gente tenha de alterar os tributos de exportadoras’

Para procuradora da Fazenda, argumentos das empresas podem mudar MP da compensação

Por Bianca Lima, Mariana Carneiro, O Estado de S. Paulo, 08/06/2024

Desde terça-feira, quando o governo Lula baixou uma nova medida provisória (MP) para ampliar a receita tributária e compensar a desoneração da folha de pagamentos, as empresas exportadoras estão em pé de guerra. A MP proíbe que as empresas usem o crédito tributário de PIS/Cofins para abater outros tributos, como o Imposto de Renda. Os créditos obtidos por crédito presumido também foram restringidos – não haverá mais ressarcimento e eles também só poderão ser usados para abater o pagamento de PIS/Cofins.

Para as empresas, trata-se de tributação indireta, que desrespeita a isenção prevista na Constituição para as exportações. A discussão já chegou ao Congresso.

Ao Estadão, a procuradora geral da Fazenda Nacional, Anelize de Almeida, disse que os exportadores têm um argumento que pode levar a uma revisão da MP no Parlamento. Exportadores afirmam que, como vendem ao exterior sem PIS/Cofins, não têm como usar os créditos para abater este tributo. “(A demanda dos exportadores) pode ser um argumento importante que eu acho que o Congresso talvez tenha de analisar diferente.”

O texto foi apelidado de “MP do equilíbrio” pelo Ministério da Fazenda e de “MP do fim do mundo” por 27 frentes parlamentares empresariais do Congresso.

Empresas estão se queixando da MP do PIS/Cofins, principalmente as exportadoras, alegando que o acúmulo de créditos decorrentes da medida vai ferir o direito constitucional de isenção tributária para as exportações. Como a sra. avalia esse pleito?

É verdade, o direito de a exportação ser desonerada é uma previsão constitucional, mas o direito de compensar créditos que está na lei é por interesse da administração tributária. Então, é uma discussão enviesada na compensação. Foi mais ou menos o que saiu na outra MP, com a limitação na compensação (em dezembro, o governo editou uma MP limitando o uso de créditos decorrentes de ações na Justiça).

Como assim?

É a mesma lógica. Se a Fazenda pública tem um débito com você, o que a Constituição diz é pagar por precatório (dívida judicial da União). E porque o sistema de precatórios é mais burocrático, a lei permite a compensação. É muito mais fácil. Só que virou uma complexidade imensa. A primeira medida provisória que limitou as compensações judiciais (acima) de R$ 10 milhões tem muito da lógica de organização interna da administração tributária. Quer dizer: “Ok, você pode compensar, mas vamos organizar”. (A demanda dos exportadores) pode ser um argumento importante que eu acho que o Congresso talvez tenha de analisar diferente. A empresa exportou e ela não paga; como é que ela vai usar esse crédito se ela só pode usar no PIS/Cofins? Talvez a gente tenha de fazer outra alteração no sistema tributário das exportadoras.

Os empresários alegam também que a mudança foi feita por meio de MP, com efeito imediato, e que isso desarranja o planejamento tributário de maneira abrupta. Isso pode ser questionado judicialmente?

Tudo pode ser questionado judicialmente, mas é o tipo de discussão que eu vejo com muita tranquilidade. O direito ao crédito não é um direito líquido e certo. Foi a mesma discussão da MP 1202 (a medida provisória que limitou os créditos judiciais, baixada em dezembro). Não vejo a utilização do crédito em compensação como um direito líquido e certo do contribuinte.

Nem no caso das exportações?

Nem no caso das exportações, mas aí eu tenho uma pulga atrás da orelha, realmente. Isso de dizer: “Ah, mas eu estava me organizando”. Ninguém tem direito adquirido sobre um regime jurídico. A medida provisória mudou e, se ela for aprovada em lei, (a empresa) se reorganiza.

E sobre o argumento de que haverá aumento de custos com a tributação, uma vez que haverá maior acúmulo de créditos a receber em uma medida feita sem anterioridade?

Não tem a ver com anterioridade isso, não considero um argumento válido. Vamos imaginar uma lei que diga: “Agora você não pode mais abater da sua base do Imposto de Renda pessoa física a escola do seu filho”. Sinto muito, mudou a lei. Ah, mas eu preciso me adaptar… A lei mudou. Não há direito adquirido sobre uma dedução ou um benefício. De alguma forma, o que se tenta fazer com essa MP é moralizar a sistemática das compensações. PIS/Cofins são contribuições que têm vinculações muito específicas (para financiar a Seguridade Social), e as empresas acabam usando o crédito para abater diversos outros tipos de tributos federais.

A MP também estipula que as empresas beneficiárias de algum incentivo tributário terão de declarar o benefício e calcular quanto deixam de recolher em impostos graças ao benefício. Se não declararem ou se errarem na conta, há previsão de multa. Qual sua avaliação? Algumas delas nem sabem que usufruem de benefícios.

Isso é uma das consequências desse tal sistema tributário caótico em que a gente vive. Porque, às vezes, vem uma lei que não tem absolutamente nada a ver e que cria um benefício para, por exemplo, agulhas, e que é autoaplicável. Ou seja: o contribuinte, o responsável tributário ali, ele abate da base dele e pronto. Mas, agora, é uma posição muito pessoal minha: eu não gosto do sistema da administração tributária baseado no enforcement, que é na multa, na punição. Os exemplos das administrações tributárias do mundo já demonstraram que não é assim que se aumenta a conformidade tributária.

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