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Após 3 décadas da fim da hiperinflação, Brasil tem de superar novos desafios/‘A agricultura é a nossa história de sucesso e mostra o caminho’

Economistas que forjaram o Plano Real contam bastidores da operação e indicam o que o País tem de fazer agora para superar o baixo crescimento e a desigualdade

Por Luiz Guilherme Gerbelli e Ricardo Grinbaum, O Estado de S. Paulo, 30/06/2024

‘A agricultura é a nossa história de sucesso e mostra o caminho’

Persio Arida Ex-presidente do BNDES, do BC e um dos formuladores do Plano Real

Último nome da equipe do Plano Real a integrar o governo em 1993, o economista Persio Arida avalia que a democracia tem sido a garantia da estabilidade econômica no País. Na gestão de Fernando Henrique Cardoso no Ministério da Fazenda, Persio foi escalado para comandar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Depois, quando o tucano foi eleito presidente do Brasil, assumiu a presidência do Banco Central.

Persio sempre esteve envolvido no debate sobre a hiperinflação brasileira e foi uma das principais cabeças por trás do Plano Real. Com a união das ideias de André Lara Resende, deu origem ao que se chamou de Plano Larida, uma espécie de embrião do Plano Real.

Hoje, lamenta que a agenda de reformas tenha ficado para trás. E diz que o Brasil precisa abrir a economia, reduzir impostos, avançar na privatização e fazer uma revisão de gastos. “Várias reformas estruturais importantíssimas estão fora do radar.”

O sr. sempre esteve envolvido no debate sobre inflação e é o último nome da equipe do Plano Real a ir para o governo em 1993. Como foi o convite?

O debate vem desde a década de 1980. Eu havia escrito um artigo propondo um único indexador para a economia brasileira. O André Lara (Resende) escreveu um sobre a ideia da reforma monetária. Juntou-se e saiu o (Plano) Larida. Tinha um certo amadurecimento da ideia vindo da reflexão acadêmica na Católica do Rio de Janeiro. Nós três, o André, o Edmar e eu, tivemos a experiência do Cruzado. E na experiência do Cruzado, algumas coisas ficaram claras. Primeiro, tem de fazer ajuste fiscal antes de começar, não depois que começa. Segundo, tem de ter independência do Banco Central na prática, para poder subir a taxa de juros se necessário. E terceiro, tem de ter comando de máquinas públicas.

Como era a relação com o Itamar durante a implementação do real?

A minha relação com o Itamar sempre foi pequena. O Fernando Henrique me levou, algumas vezes, para conversar com ele, especificamente, sobre privatização. Era um tema que ele concordava, mas, no fundo, o seu coração não estava lá. Tive uma conversa em que ele insistiu, em particular, no congelamento de preços.

Todo mundo queria o congelamento…

Eu falei que não era possível. Já tinha sido tentado. E ali, claramente, o que havia com o Itamar era uma falta de repertório. Para ele, combater a inflação era congelar preço. Não lhe ocorria nada de diferente. No fundo, a insistência dele no congelamento se dava porque era a única coisa que ele entendia que brecava o processo inflacionário. Eu lembro de ele dizer: “E um tabelamento mais leve? Um controle mais flexível?”. Era o repertório que ele tinha.

E qual é a agenda do País agora?

Desde o Plano Real, o Brasil mudou muito. Melhorou em muitas coisas. Houve, digamos assim, uma surpresa, para muitos favorável, o fato de que a estabilidade de preços fincou e existe até hoje. Mas a promessa do crescimento econômico sustentado e alto acabou não vingando.

Por quê?

Eu tenho, para mim, que a interrupção do ritmo de reformas estruturais, que foi o lastro do real durante os oito anos do Fernando Henrique, tem muito a ver com isso. A economia até cresce 2%, 2,5%. Dá para a renda per capita aumentar um pouquinho. Mas, claramente, tem uma perda de dinamismo. E qual é o setor dinâmico da economia brasileira? É a agricultura. A agricultura é uma história que deu certo no Brasil. E por que deu certo? Não tinha intervenção governamental. Quem olha o sucesso agrícola tem a receita para o sucesso brasileiro. É a mesma coisa. Tem que abrir a economia, fazer privatização, não precisa de estatal para fazer política pública. Tem de conter gastos para poder baixar impostos, integrar com a economia externa e desenvolver o que é a sua vantagem comparativa. A agricultura é a nossa história de sucesso e mostra o caminho.

E como o sr. está vendo o caminho do Brasil hoje?

Várias reformas estruturais importantíssimas estão fora do radar. Privatização, abertura de economia, reforma administrativa. Tudo isso está fora do radar político. Tem um problema fiscal e que melhoria muito se fossem tomadas algumas poucas medidas. Basicamente ir na direção do Fundo Social de Emergência lá de trás, desvincular receita de despesa. Vale para o salário mínimo e Previdência, vale para Educação, Saúde e Arrecadação. São algumas poucas medidas que fariam uma diferença enorme. Tem de fazer uma revisão de gastos. Todos os países fazem. Programas de gastos têm alguns que vão bem, outros vão mal. Precisa avaliar. Interromper os que estão indo mal. Alguns programas perdem prioridade ao longo do tempo. Esse trabalho de revisão de gastos, de contenção de gastos, de digitalização do governo, de terceirização, tem de ser seguido para poder atingir o objetivo de reduzir a carga tributária.

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