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A burocracia atrapalha, mas não pode servir de muleta

Reportagem Estadão-29/01/2017

Segundo os especialistas, ela é um obstáculo para os empreendedores, mas não é o maior deles.

Apesar de seu peso, a burocracia brasileira não é o principal obstáculo para empreender no País, de acordo com especialistas da área. O professor de empreendimento da Business School São Paulo (BSP) Alessandro Saade não nega que o Brasil impõe limites burocráticos, mas ele não atribui exclusivamente a esse fator a dificuldade de empreender.

“A burocracia existe, e é um dos maiores desafios. Mas ela não pode servir de muleta”, diz Saade. “O empreendedor que começa do zero e fatura milhões enfrentou a mesma burocracia que um empresário que quebrou ”.

A diretora de Cultura Empreendedora da Endeabor, Camilla Junqueira, compartilha do mesmo ponto de vista. “A burocracia é uma barreira que inibe, mas ela acabou se tornando uma crença limitante, que intimida quem deseja empreender”, diz ela. Para Camilla, o grande problema, que supera o fator burocrático, é de ordem cultural.

“O principal entrave é aquele que os próprios brasileiros impõem a si mesmos. Eles não confiam no próprio negócio, mas eles têm de acreditar que mesmo com as amarras do sistema, é possível”.

Há uma década, Regina Pires, de 41 anos, tentou abrir sua empresa, uma agência de comunicação. Depois de apenas dois anos, ela teve de fechar as portas. “O negócio começou a desandar em 2008, com a crise internacional. Meu maior cliente começou a atrasar o pagamento e não consegui contornar a situação”, diz ela. Mas Regina alega que a burocracia também foi determinante para o insucesso da empresa.

“O mais difícil para mim foi a questão burocrática. É um fator que pesa quando o negócio é pequeno. Traz muita dor de cabeça ”.

Para David Kallás, professor do Insper, a papelada não pode ser responsável pela falência de companhias.

“É claro que ela representa um entrave, mas não é o maior deles. Fechar uma empresa devido à burocracia é desculpa. O Brasil é burocrático e seus tributos são altos, mas isso funciona dessa maneira para todos”, diz ele.

Na visão de Letícia Menegon, coordenadora do Centro de Desenvolvimento de Empreendedorismo da ESPM, o atual momento econômico do País é o grande responsável pelas dificuldades que enfrentam os empreendedores no Brasil.

“Hoje, o fator instabilidade supera as barreiras da burocracia. As incertezas políticas e econômicas são nosso maior obstáculo”, diz Letícia. “Quando surgiram os primeiros rumores sobre um eventual impeachment da ex-presidente Dilma Roussef, o mercado ficou praticamente congelado. Os empreendedores tinham pouca demanda. Esse tipo de instabilidade mexe muito com os ânimos dos consumidores e, portanto, do mercado de modo geral. “

Incentivos. Quem tem familiaridade com o ambiente emprendedor lembra que, para diminuir a papelada e evitar aborrecimentos decorrentes da burocracia, o governo oferece alguns incentivos que facilitam os negócios.

“Apesar do tempo que se leva para abrir uma empresa aqui (de 3 a 5 meses), os micro e pequeno empresários contam com estímulos como Supersimples, que reúne todos os impostos num só”, afirma Kallás.

Com o Supersimples, programa criado em 2006, os impostos federais, estaduais e municipais são pagos em um único boleto. Todas as atividades de comércio, indústria e a maior parte das atividades de serviços pagam menos tributos no Supersimples.

“Quem não obtém sucesso com o negócio diz que no Brasil é burocrático até o processo de fechar a empresa”, afirma Saade, professor da BSP. “Então, a melhor saída é cuidar muito bem do negócio para que ele não feche”.

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