ATHAYDE: ‘EVITAMOS CONVULSÃO SOCIAL’
Sônia Racy – O Estado de S. Paulo – 11/10/2020
Celso Athayde é fundador da Central Única das Favelas que atua em 5 mil comunidades no Brasil. Na pandemia de covid-19, a CUFA arrecadou R$ 150 milhões em doações para socorrer aqueles que não tinham reserva financeira, emprego, nem o que comer no dia seguinte. “Se a sociedade não se mobilizasse, teríamos vivido uma convulsão social”, acredita.
No dia 20, Athayde receberá o título de cidadão paulistano concedido pela Câmara dos Vereadores. Além disso, ele é CEO da Favela Holding – conjunto de empresas sociais – e empresário do rapper MV Bill com quem escreveu livros como Falcão – Meninos do Tráfico. A seguir os principais trechos da conversa.
Como avalia o impacto da pandemia nas favelas?
Os moradores da favela consomem toda a renda que tem, portanto, não têm reservas. Se a sociedade não se mobilizasse para ajudá-los, teríamos vivido uma convulsão social. Haveria fome em grande escala. Consequência do que acontece quando patrões quebram, shoppings centers fecham, funcionários não conseguem pegar empréstimo porque quem poderia socorrer também está em dificuldades. É uma situação de caos. Evitamos uma convulsão social.
Vocês bateram recordes de doações para enfrentar a crise?
A CUFA mobilizou mais de R$ 150 milhões. Agora vamos lançar o projeto Alô Social, fornecendo 500 mil chips para mães e conexão Wi-Fi em 150 nas grandes favelas brasileiras por seis meses, quando as aulas já devem ter voltado. Um chip viabiliza conectividade não apenas para uma pessoas mas para a família inteira.
Como a CUFA lida com assédios de políticos nas eleições?
Somos muito assediadas porque estamos no País inteiro. Temos como princípio não apoiar nenhum candidato, nos comunicamos com gestores públicos e não com partidos.
O auxílio emergencial do governo federal é tido como angariador de voto. Concorda?
Quem obrigou o governo a fazer o programa emergencial e estabeleceu o valor de R$ 600 reais foi o Congresso Nacional. Mas o governo tem obrigação de proteger a sociedade e aí ao fim sim acaba virando caça voto.
Como se sente ganhando o título de cidadão paulistano?
Morei na rua e em abrigo público dos seis aos 12 anos, no Rio de Janeiro. Eu e minha mãe começamos como camelôs. Viajávamos para São Paulo para comprar moletom e voltávamos para vender no Rio. Sempre que estava em São Paulo, eu brincava comigo mesmo dizendo que ia conquistar a cidade, que não é perfeita, mas é onde as pessoas gostam de fazer as coisas direito. Fiquei com isso na cabeça. O tempo passou e me transformei, em 2010, em um empresário de uma banda de rap chamada Racionais MC’s. Agora, vereadores da cidade se reuniram para reconhecer o Celso Athayde como uma pessoa que merece o título de cidadão paulistano pelo trabalho na pandemia. Isso, simbolicamente, é o que sonhei um dia: eu conquistei São Paulo.
ARTIGO645