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Incertezas agora, incertezas depois

O Estado de S. Paulo – 12 Apr 2020 – CELSO MING

Não é verdade que todos estejam preocupados somente em como atravessar essa pandemia, pouco ligados ao day after. Não há quem também não se pergunte sobre o que será do emprego e do ganha-pão; o que será da evolução da economia e do patrimônio familiar, hoje em pandarecos.

A maioria dos consultores, dos chefes de economia dos bancos e dos administradores de finanças vem apresentando suas projeções. Nesta segundafeira, o Banco Central divulgará, no meio de outros itens do Boletim Focus, as novas estimativas de cerca de 100 desses rastreadores permanentes da economia que, há uma semana, já apontaram para uma queda de 1,18% do PIB. Na última quinta-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes, confidenciou a senadores que, se a crise se estender até depois de julho, a queda do PIB do Brasil em 2020 poderá chegar a 4%. E este é número cada vez mais sujeito às revisões da hora.

Não há certeza sobre nada. O que há são torcidas e algumas apostas. Como há, por exemplo, a aposta em que a economia da China, em franca recuperação, será a primeira locomotiva a voltar a puxar os vagões do resto do mundo, ainda neste segundo trimestre. O pressuposto é o de que não haverá recaídas graves, o de que o ataque do coronavírus desta vez não acontecerá em ondas, como se vê nos terremotos. Mas é uma hipótese que os epidemiologistas não garantem como certa.

Até mesmo uma megaoperação junta-cacos poderá ser confusa e fortemente complicada, a começar pelo inevitável enfrentamento da desorganização das contas públicas. Mesmo depois do destravamento dos cofres federais, as finanças dos Estados e municípios sairão da crise ainda mais enfraquecidas do que já estavam. Grande número de empresas estará quebrada ou perto disso. O desemprego e a derrubada da renda familiar continuarão a asfixiar o mercado consumidor. Não é verdade que o Tesouro tudo pode, como às vezes alguns fingem acreditar. Tesouro nenhum cria renda. Apenas distribui ou deixa de distribuir o que acaba chegando até ele.

Aumentarão as pressões por aumento de impostos. Mas como arrancar mais arrecadação de uma sociedade que perdeu tanto patrimônio e tanta renda? Nessas horas, sempre aparece a ideia de sobretaxar os mais ricos. O problema é que, se isso estivesse para acontecer, seria inevitável uma corrida ao dólar. E, ninguém se iluda, tratase de um dos impostos mais difíceis de

arrecadar. Os grandes proprietários de terras, de imóveis urbanos e de participações acionárias teriam de despejar de repente um pedaço de seu patrimônio no mercado para ficar em condições de recolher ao Fisco os novos impostos que passariam a ser cobrados?

Ah, então vamos à emissão de moeda? É uma opção. Mas, novamente, ninguém se iluda: seria a mais cara para o trabalhador, dada a tesourada real dos salários e das pequenas rendas que a ela se seguiria.

A paralisação da economia, tanto a que já aconteceu quanto a que ainda está para acontecer, produzirá certo número de vítimas entre as empresas, especialmente no segmento dos pequenos negócios. Embora a maioria dos bancos se disponha a melhorar as condições dos empréstimos, será inevitável aumento da inadimplência entre os que terão de honrar créditos bancários. E isso significa que o Banco Central poderá ter de ajudar certas instituições financeiras a aguentar o tranco.

A recuperação poderá ser dolorosa, mas a partir do momento em que prevalecer a convicção de que a pandemia terá ido embora, tudo poderá ficar mais suportável.

O problema é que não há como garantir nem isso, porque o País está sem comando. Se no momento não há liderança nem na estratégia de enfrentamento de uma crise tão grave, também tende a faltar na hora de recolocar a casa em ordem.

E depois?

ARTIGO291

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