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PAPER 167: Projeto de País (EU SOU BRASIL!!!)

Tema: “O que é o Ajuste Fiscal?” – 2

 

“A economia é a ciência severa da escassez, frequentemente subvertida pela política, a utopia alegre da abundância.”

Max Weber (1864-1920) sociólogo alemão

 

A Constituição do país – o diploma institucional máximo – afeta  o destino e a vida das pessoas, pela qualidade do tratamento dispensado às Contas Públicas, que são determinantes para o Desenvolvimento da nação.

Por outro lado, as pessoas são o maior patrimônio nacional, seja pelo padrão intelectual e cultural, seja pelo nível do poder aquisitivo decorrente do desempenho profissional, mais importante até do que as riquezas naturais.

Desconsiderando países de regime autoritário, mesmo que muitas vezes até pratiquem eleições, nos países democráticos de eleições livres tem sido enfatizada a Democracia, relegando ao segundo plano, quando for o caso, a República e/ou a Federação – regime republicano e/ou o federalismo –, no tocante à percepção da sociedade.

Os eleitores chegam ao ponto de confundir e, em consequência, conceber que eleição é o suficiente para ser democracia. Disso decorre a má qualidade da representação política, em que governantes se dissociam dos governados (como tem ocorrido no Brasil), enfraquecendo, inibindo e às vezes eliminando o exercício da cidadania. (Tema do artigo do professor Ives Gandra Martins publicado pelo Estadão de 25/01/2018 sob o título “Brasília, a Versalles de Luís XVI no Brasil de 2018” argumenta que “A corte de Versalles estava distanciada da realidade francesa, como a corte brasiliense de burocratas e políticos está distanciada das necessidades brasileiras, pouco sensível ao alerta de especialistas…” e dos movimentos cívicos (acréscimo nosso).

Assim, a Democracia tende a ser incompleta e estática (fica só nas eleições, negligenciando a avaliação necessária das decisões e da conduta do eleito), ao invés de praticar dinâmica e permanente participação do eleitor antes e depois da eleição.

Há um exemplo ocorrido no Estado da Califórnia (USA) quando elegeu-se governador o ator de cinema Arnold Schwarzenegger, eleito em 2003 substituindo o governador até então no exercício do cargo. A destituição do governador de então mediante a prática do Instituto do “Recall” se justificou pelo fato de ele ter conduzido o Estado a operar em regime de desequilíbrio orçamentário (o que também ilustra a importância do equilíbrio orçamentário).

Nesse episódio a iniciativa e a prática foi fundada na cidadania, sem que tenha havido interferência de outros poderes (Judiciário, Legislativo, Executivo, bem como de outros Entes Federativos externos ao fato), ou seja, o poder direto do eleitor.

O exercício da cidadania é fator vital e decisivo para a qualidade da Democracia; a inibição da cidadania é risco de o país descambar para regime autoritário.

Muitos costumes e instituições do federalismo americano são produto da Sociedade Civil e não são governados nem por órgãos federais, nem pelas estruturas legais do Estado; visam construí-los a partir de baixo para cima, pela cidadania – um ponto notado e elogiado por Tocqueville em “A democracia americana” – uma segurança contra a tentativa de controlá-los e modificá-los através de instituição do Estado.

Muito contribui para inibir a cidadania a vigência de um Estado Federal ou Federalismo centralizado institucionalmente e/ou centralizador operacionalmente, como tem acontecido no Brasil desde a herança imperial, agravado deliberadamente na Era Vargas, da qual resultou a Ditadura que durou 15 anos, de 1930 a 1945, com seu retorno ao poder pelo voto em 1950 até seu traumático suicídio.

Ao longo da vigência da República resultou um Estado Federal centralizado e (…) “Atualmente, com a maior crise econômica da nossa histórica em conjunto com o pífio desempenho da economia desde a redemocratização, cresce a busca por um novo caminho. Como a reconstrução do federalismo pode auxiliar no desenvolvimento do país? É possível responder à questão através de três argumentos: competição, inovação e eficiência.

Primeiramente, o federalismo promove a competição entre os governos subnacionais. Não havendo um governo central que forneça recursos e socorra os Estados em dificuldades, resta-lhes promoverem contas públicas saudáveis e um ambiente favorável de negócios.

O Estado ou município que decidir adotar linha contrária observará a migração de capital, de credores e de trabalhadores e, consequentemente, a perda de arrecadação e de qualidade do serviço público. Dentro de um sistema competitivo democrático, a migração de votos do incumbente para a oposição é a consequência natural.

No Brasil, como as normas e instituições são majoritariamente nacionais, os Estados … (e os Municípios)… têm dificuldade de competir. Além disso, como os recursos advêm em grande parte da União, os incentivos na adoção de práticas pró-mercado são limitados. Para a elite local, muitas vezes é melhor manter práticas populistas e ao mesmo tempo construir fortes laços de dependência com o governo federal.” (…)

(…) …os governos subnacionais são laboratórios de inovação. (…)  (…) …experiências locais exitosas que se espalharam pelo país antes de serem adotadas pelo governo federal. A competição entre os governos subnacionais é potencializada pela liberdade em inovar.

No Brasil, a concentração das atribuições normativas na União limita o surgimento de experiências bem-sucedidas. Em destaque, desde a era Vargas, o direito administrativo relacionado à contratação de pessoas, bens e serviços possui regras gerais de caráter nacional, que só podem ser modificadas pela União. (…)

(…) A descentralização torna os governos mais capazes de responder de forma eficiente às demandas da população. É natural que em um país como o Brasil haja diferenças de prioridades entre as regiões. A centralização dificulta o poder público de apresentar soluções adequadas para cada caso. Um bom exemplo é o estabelecimento em sede constitucional de gastos mínimos elevados e segregados para saúde e educação, em um país com enorme heterogeneidade demográfica por região. (…)

(…) O federalismo clássico aposta na capacidade das localidades de encontrarem soluções próprias aos seus desafios ao invés de esperar uma solução vinda do centro. Neste sentido, democracia e economia podem se beneficiar de um modelo mais descentralizado de país.” (Artigo disponível no “site” www.conselhobrasilnacao.org, “Crescimento econômico, democracia e federalismo”).

Enfrentar a centralização do Estado requer Reformas estruturais para possibilitar a prática da cidadania, e assim fortalecer a Democracia. “Qualquer cogitada proposta, fora da política e da Democracia Representativa Republicana e do objetivo do Desenvolvimento do Brasil, é inegociável.” (PAPER 164 – 12/08/2024).

Trabalha em sentido contrário ao fortalecimento da Democracia a recém, autodenominada, Reforma Tributária, que centralizará por completo o poder, de agora em diante, pela centralização tributária (foi o que fez Vargas).

Antecedendo a esta nefasta aprovação pelo Congresso Nacional, Reforma Tributária que o Conselho Brasil-Nação combateu bravamente e se pronunciou publicamente através dos PAPERs 47 (05/06/2019), 48 (08/06/2019), 51 (24/07/2019), 52 (29/08/2019) e 70 (06/03/2020) os Entes Federativos subnacionais dispunham, embora parcialmente, de alguma independência financeira, contando com receitas próprias (ICMS e ISS), por serem insuficientes eram completadas pela União; com precária autonomia política.

Essa dependência financeira conduziu ao que o Conselho Brasil-Nação cunhou de “Ciranda Fiscal”, pela qual, para obter o equilíbrio orçamentário em toda a estrutura federativa, o prefeito se socorre do governador e do presidente da República, o governador se socorre do presidente, e este se socorrre do Congresso Nacional (tudo legal e constitucional), que aprova anualmente a emissão de Títulos Públicos para obter o Equilíbrio Orçamentário das Contas Públicas Federais, e também para “rolar” a dívida acumulada da União.

A “Ciranda Fiscal” se comprova pela matéria divulgada pelo Estadão de 20/12/2024 p.A3 sob o título “A semente da próxima crise dos Estados” com subtítulo “Com aval da União, e por unanimidade, Senado aprova PL que permite a enésima renegociação da dívida dos Estados sem nem se quer exigir corte de gastos dos caloteiros contumazes” (disponível no “site” www.conselhobrasilnacao.org) (Observação: não se trata da próxima crise, mas de continuação da que está aí, não resolvida ainda.)

O desequilíbrio orçamentário é um desleixo que vem se repetindo anualmente, com isso levando os governantes à prática da “Ciranda Fiscal”, ao invés de eliminar a causa. (Em outubro/2024 a dívida da União totalizava R$ 8,9 trilhões, enquanto que a Receita dos últimos 12 meses foi de R$ 2,366 trilhões, mantém-se desconhecida a situação correspondente dos Entes Federativos subnacionais). (Com frequência ouve-se que dívida pública não é para ser paga, mas “rolada”, o que por si só já é uma imoralidade e uma irresponsabilidade para com as futuras gerações).

O federalismo centralizado, como o praticado no Brasil, tende a levar o Estado Federal a se aproximar do Estado Unitário, com as consequências nocivas para a prática da cidadania, a formação política da população, e ao final a qualidade da Democracia e da Economia, em prejuízo da geração de riqueza, empregos e bem estar da população.

“Ajuste Fiscal” tornou-se uma atividade rotineira na Administração Federal, que gerou a cultura política já consolidada do desequilíbrio orçamentário com Receitas menores que as Despesas, enquanto que em uma economia saudável e sólida que objetive a prosperidade, as Receitas devem superar os dispêndios (despesas do Estado mais investimentos públicos). O ajuste visa obter equilíbrio orçamentário ao recorrer ao endividamento do Governo Federal detentor do monopólio da emissão de Títulos Públicos que são adquiridos por investidores, tanto nacionais como do exterior.

Além do que, o Estado brasileiro tornou-se muito grande pela obrigação legal constitucional  de arcar com o atendimento da população dadas suas condições sociológicas, em face da reduzida capacidade de geração de receitas tributárias  (tributos dependem de investimentos públicos e privados, nacionais e do exterior, no sistema produtivo).

Tem sido recorrente em nossos PAPERs a recomendação de que o equacionamento das Contas Públicas do governo federal, requer a redução do custo do Estado pelas Reformas estruturais e, ao mesmo tempo, a elevação do patamar do PIB pela implementação de Planos Econômicos com ênfase em exportações, inclusive do Agro, a Indústria de Transformação e Serviços (receita tributária é função do PIB), ou seja, diminuir a despesa e aumentar a receita.

A redução do custo do Estado (União, Estados e Municípios) se dará pela transformação para um federalismo descentralizado (política, administrativa e tributária) cada Ente Federativo vivendo de suas receitas próprias, da sua produção, das suas decisões, das suas vontades e ambições. O atual federalismo centralizado e centralizador como temos no Brasil leva sempre a precária autonomia política e à prática da “Ciranda Fiscal”, ao final a “bomba” estoura no governo federal, cuja competência constitucional detém o monopólio de se endividar, via Títulos Públicos.

De sorte que, na visão do grande público, realmente recai sobre o governo da União (o presidente) a culpa pelo País que temos, visto que a Elite (política e econômica) não assume o propósito do Desenvolvimento. Assim, parafraseando Paul Krugman (Estadão, 11/12/2024 p.A13), “…se nos levantarmos contra a caquistocracia – o governo dos piores…” poderemos encontrar o caminho para um país melhor

 

CONCLUSÃO

 

O Estado brasileiro (os Entes Federativos União, Estados Federados, Municípios e as instituições que lastreiam o “establisment” burocrático estatal) tem se constituído de arranjos em arranjos ao longo da história, ao invés de extirpar as causas dos conflitos e crises, que impedem o Desenvolvimento do País, em que pese o brilho individual de destacados vultos brasileiros na política e em todos os campos de atividades.

Mediante tal conduta, o País antes no Império e já agora na República, ainda não sabe “fazer” educação, a começar que esta deve ser recebida no Lar, e reservada a instrução para a Escola (ver Estadão de 13/12/2024 p.A3 sob o título “Professores que não sabem ensinar”, e PAPER 26 de 20/08/2018).

Essa é a causa primeira a ser extirpada, pois os Recursos Humanos são a principal riqueza de um país. Falta-nos, enquanto País, objetividade. Todos os jovens e crianças, além dos pais, podem passar a ambicionar realizar seus sonhos, e serem pessoas preparadas, para contribuir para o Desenvolvimento.

Não se trata de quantidade de professores e escolas, em todos os níveis, a custos elevados, mas de qualidade. É o que conta para o Desenvolvimento, para o embate na geopolítica, ambiente de cooperação, mas decisivamente de competição. Nessa arena só os melhores vencem.

Temos reiterado que das Reformas estruturais a serem conseguidas, deve resultar um primeiro objetivo: Contas Públicas saudáveis, leia-se, Receitas superiores aos dispêndios (custo do Estado e Investimentos Públicos), que é básico para viabilizar o Desenvolvimento, em benefício de toda a nação.  Satisfeita esta condição, estará o País capacitado e/ou preparado para a orientação política de implementar um Projeto Nacional de Desenvolvimento, sediado nos novos partidos Partidos Políticos que tenham a assunção e a cumplicidade da Elite, pois todos os brasileiros esperam por essa atitude (Paul Krugman, Estadão 11/12/2024 p. A13: (…) “… o público perceberá que a maioria dos políticos que ralham contra as elites é de elite em todos os sentidos. E começará a responsabilizá-los por sua incapacidade de cumprir suas promessas.” (…)

A redução do custo do Estado, objeto de reiteradas propostas e sugestões do Conselho Brasil-Nação, não reduz o poder do Estado, pelo contrário aumenta seu poder, sua força e seu papel, amparado por uma economia de prosperidade e uma política norteada pelo Desenvolvimento fundado no bem comum e no interesse nacional, condicionantes de fácil compreensão popular e de elevada probabilidade do apoio da sociedade.

É inaceitável seguir esse “figurino”, que já vem de longa data, em especial nos últimos 40 anos, período de visível e brilhante desenvolvimento dos países asiáticos, enquanto amargamos o fato de que entre 156 milhões de eleitores, apenas 32 milhões (20%) estiveram obrigados em 2024, a prestar declaração de Imposto de Renda pessoa física (renda superior a R$ 28,5 mil anuais, ou R$ 2,375 mil mensais).

“Desse mato não saíra coelho”, desse universo de poder aquisitivo não sairá PIB, sequer para o Estado atual, cabalmente comprovado, a causa de necessidade de “Ajuste Fiscal” todo ano fiscal, ou seja, sem as Reformas estruturais certas e eficazes com a objetividade requerida, seguiremos o “figurino”. Relembrando GOETHE: “O que é mais difícil de tudo? Ver com seus olhos o que seus olhos colocam diante de você.”

É inadmissível a sociedade brasileira, após tantos revezes de atraso, estar assistindo ainda a inércia, a passividade, a acomodação e a inação da Elite política ante essa fragilidade causadora da necessidade de “Ajuste Fiscal”, enquanto que em situação similar – desequilíbrio orçamentário – a punição se dá em ameaça para “derrubar” governos, como ocorre atualmente no Canadá, França, Alemanha, e outros. Este o nível da gravidade do tema.

Nossa atual Constituição, à qual todos os habitantes se sujeitam, com especial protagonismo para os juízes e o Poder Judiciário seu guardião, não permite  “desatar o nó” no qual o Brasil se encontra envolto, o que não tem possibilitado mudanças de porte adequado com (…) “… pontos básicos iniciais que se propõem para encaminhar o Brasil para condições mínimas e básicas de sobrevivência civilizada como país livre, independente, soberano, democrático, republicano e desenvolvido.” (PAPER 35 – 15/01/2019 e PAPER 40 – 11/03/2019).

A sociedade brasileira merece melhor perspectiva.

 

A democracia fundada no Estado de Direito e na cidadania não é uma estação de chegada, mas uma maneira de viajar, visando ao desenvolvimento econômico, político, cultural e social para tornar o Brasil a melhor nação do mundo para se viver bem.

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