PAPER 99: Projeto de País (EU SOU BRASIL!!!)
Tema: “Nova Constituição – 2”
“É impossível não ver que estamos nos encaminhando para um grande problema.”
J.R. Mendonça de Barros, economista
(Estadão, 15/11/2020)
(…) “A governança é arte de tecer elos entre cidadãos, promover a sua amizade, laço essencial do Estado. Tal doutrina é posta no diálogo POLÍTICO de Platão. Se, pelo contrário, o dirigente divide as pessoas, a tirania surge com o signo da morte. Segundo Platão, a POLIS é ligada internamente pela PHILIA. ‘O maior bem para a cidade é o que a une e a torna uma’ (República, 462 a-b). Tal elo faz dos múltiplos indivíduos um conjunto poderoso. ‘Entre amigos tudo é comum’ (República 424 a). O Estado pertence a todos e cada um deve respeitar os concidadãos.” (…) Roberto Romano, professor da UNICAMP, Estadão de 17/11/2020, página A2, artigo “A pandemia do ódio, Trump e o Brasil”
No Brasil, em face das jornadas de 2013, as lideranças (políticas, empresariais e sociedade civil), ao fazer ouvidos moucos, não se dignaram “respeitar os concidadãos.”
Superar as dificuldades deste momento, que resultou do passado e deve se viabilizar pela governança democrática do povo, que é superior a gestões de organizações/instituições, requer inteligência, expertise, estratégia, que representam apenas 1% do esforço, enquanto que a transpiração, os restantes 99%.
As ações de governança ficam limitadas cada vez mais pela fragilidade das finanças públicas, tendo como causa originária a Constituição de 1988 e também a do que a ela antecedeu, condicionando toda a gestão pública das três esferas dos entes federativos e dos três poderes. Lógico, é a Carta Magna.
Todos os cidadãos e todas as autoridades constituídas, dos poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, têm a obrigação de obedecer, cumprir e fazer cumprir a Constituição. O endividamento público do País, bem como nossas condições sociais, decorre dessa estrutura constitucional, inclusive a própria eleição de governantes.
Os governantes mostram-se pressionados a agir em busca de resultados, porém ficam sujeitos aos rígidos controles impostos pela Constituição e aos descontroles que eles mesmos criaram.
O Sistema Produtivo com compreensíveis anseios de sair desse quadro de crise econômica que já vem desde maio/2014, sem falar da de 2008, tem de buscar enfrentamento às ameaças de seus próprios ativos, sempre construídos com sacrifício e obstinação ao longo de décadas.
A sociedade como um todo se aterroriza com a falta de perspectiva, sedimentando ambiente de desânimo nos adultos e de desesperança nos jovens. Nossa expectativa é de que pessoas do bem, patriotas e comprometidas com o objetivo do bem estar e segurança da atual geração, assumam a responsabilidade para com os idosos e os jovens e crianças, as quais nos ampararão amanhã.
A crise de maio/2014, está ainda aí, há mais de 6 anos, é muito tempo sem solução à vista pelas vias constitucionais e legais vigentes.
A inação conduzirá ao crescente custo do Estado, na medida em que a POBREZA aumenta. Essa situação é visível, no Brasil e em todo o mundo, porém mais severa nos países pobres e nos emergentes.
O Estadão de 01/10/2020, página A11, ilustra tal situação em reportagem “Na Argentina, pobreza atinge 40,9% da população”, com 10,5% de indigência; um dos piores registros da história do país (informou o Instituto de Estatística – Indec). Segundo o ministro de Desenvolvimento Social argentino, Daniel Arroyo, “atribuindo parte da cifra a uma pobreza estrutural, desencadeada por sucessivas crises econômicas que afetaram o país nas últimas décadas.”
Esta é a consequência da falta de ação dos líderes das nações à altura dos desafios, ao não enfrentarem as crises para eliminar as suas causas.
É necessário que se tomem as decisões que já se fazem tardias, quais sejam criar novas regras constitucionais e legais.
Acumulam-se problemas (exemplo, déficit orçamentário) que demandam escolha entre conformismo (fazer dívida mediante emissão de títulos públicos) e incertezas (que podem decorrer de redução de despesas), comumente escolhe-se o conformismo, mesmo sabendo que o sistema – que dá a tão cara ilusão de certeza – está morrendo.
Os governantes atuais não conseguirão resolver, tampouco os futuros (“ninguém irá serrar o galho no qual está sentado”). Eliminação de privilégios e superação da ineficiência estatal em todos os níveis federativos e nos três poderes, desconcentração do poder político e financeiro no governo federal, requer tratamento sistêmico, não pontuais. Não é empreitada para Congresso Nacional de baixíssima produtividade comprovada, sobre temas relevantes, e constituído de interesses pouco republicanos que amarram o País ao atraso. Tem que ser outra a escolha, para decisão eficaz.
Nos adverte o advogado e economista mestre pela PUC-RIO, André Senna Duarte, em artigo divulgado pelo Valor Econômico de 30/05/2019, sob o título “Crescimento econômico, democracia e federalismo”, texto integralmente constante do “PAPER”47 de 03/06/2019, a seguir parcialmente transcrito, referindo-se à experiência e herança brasileira varguista, de concentração de poder no Governo Federal:
“No dia 27 de novembro de 1937, na extinta praia do Russel, onde hoje se encontra parte do aterro do Flamengo no Rio de Janeiro, a primeira de uma série de cerimônias públicas em celebração ao Estado Novo transcorreu.
Uma gigantesca bandeira brasileira foi estendida por trás de um altar a céu aberto. A cerimônia foi conduzida pelo arcebispo do DF. Três mil crianças com uniformes escolares cantaram sob a regência do maestro Villa-Lobos. Autoridades civis e militares cortejaram o presidente, Getúlio Vargas, juntamente com uma enorme multidão.
Após o discurso de Vargas, bandeiras nacionais em substituição às dos 20 Estados, DF e território do Acre foram hasteadas em preparação ao que seria o ponto culminante da celebração: jovens conduziram em fila as tradicionais bandeiras regionais para junto de uma pira, sendo as bandeiras incineradas individualmente.
Com a crise de 1929, diferentes nações buscaram concentrar os poderes na mão do Poder Executivo e, onde cabível, no governo central. Tal fenômeno ocorreu até mesmo nos EUA, com a criação de diversos programas federais. No entanto, se nos EUA a Suprema Corte e o Congresso estabeleceram limites que impediram a deformação do sistema, no Brasil de Vargas, sem sistema de freios e contrapesos, o federalismo instituído pela Constituição de 1891 foi queimado em praça pública.
Atualmente, com a maior crise econômica da nossa histórica em conjunto com o pífio desempenho da economia desde a redemocratização, cresce a busca por um novo caminho. Como a reconstrução do federalismo pode auxiliar no desenvolvimento do país? É possível responder a questão através de três argumentos: competição, inovação e eficiência.
Primeiramente, o federalismo promove a competição entre os governos subnacionais. Não havendo um governo central que forneça recursos e socorra os Estados em dificuldades, resta-lhes promoverem contas públicas saudáveis e um ambiente favorável de negócios.
O Estado ou município que decidir adotar linha contrária observará a migração de capital, de credores e de trabalhadores e, consequentemente, a perda de arrecadação e de qualidade do serviço público. Dentro de um sistema competitivo democrático, a migração de votos do incumbente para a oposição é a consequência natural.
No Brasil, como as normas e instituições são majoritariamente nacionais, os Estados têm dificuldade de competir. Além disso, como os recursos advêm em grande parte da União, os incentivos na adoção de práticas pró-mercado são limitados. Para a elite local, muitas vezes é melhor manter práticas populistas e ao mesmo tempo construir fortes laços de dependência com o governo federal. A dualidade sobre a reforma da Previdência pelos governadores do Nordeste é consequência destes incentivos.
A capacidade de promover inovação institucional é outro argumento favorável. Nos EUA, os governos subnacionais são laboratórios de inovação. A regulação de produtos e serviços, seguro desemprego, leis de combate à discriminação e proteção ambiental começaram com experiências locais exitosas que se espalharam pelo país antes de serem adotadas pelo governo federal. A competição entre os governos subnacionais é potencializada pela liberdade em inovar.
No Brasil, a concentração das atribuições normativas na União limita o surgimento de experiências bem-sucedidas. Em destaque, desde a era Vargas, o direito administrativo relacionado à contratação de pessoas, bens e serviços possui regras gerais de caráter nacional, que só podem ser modificadas pela União. O mesmo ocorre com as normas que regulam o orçamento.
A crise dos governos subnacionais provocada sobretudo pelo crescimento das despesas com pessoal é agravada pela falta de alternativas para reversão da trajetória. Não é sem razão que, apesar de recém-eleitos, muitos governadores não promovem ajustes fiscais relevantes por conta própria.
A descentralização torna os governos mais capazes de responder de forma eficiente às demandas da população. É natural que em um país como o Brasil haja diferenças de prioridades entre as regiões. A centralização dificulta o poder público de apresentar soluções adequadas para cada caso. Um bom exemplo é o estabelecimento em sede constitucional de gastos mínimos elevados e segregados para saúde e educação, em um país com enorme heterogeneidade demográfica por região.” (…)
(…) “O federalismo clássico aposta na capacidade das localidades de encontrarem soluções próprias aos seus desafios ao invés de esperar uma solução vinda do centro. Neste sentido, democracia e economia podem se beneficiar de um modelo mais descentralizado de país.”
Adquirir condições para sair da atual situação requer outro Estado, menos custoso, no limite factível, e com o aumento da capacidade de tomada de decisões, com a rapidez suficiente diante de oportunidades que possam surgir, bem como criá-las estrategicamente. Um exemplo é o Mercosul: improdutivo e burocratizante, capaz de emperrar iniciativas de todos e cada um de seus membros. O tempo de experiência com o Mercosul já foi suficiente para recomendar o encerramento. O mundo atual requer agilidade, produtividade e muito trabalho.
É preciso coragem para se fazer análise correta da História, buscando novas diretrizes. Para tanto, o articulista, jornalista e historiador, Marcos Guterman em “País enfrenta superabundância de passado não resolvido”, divulgado pelo Estadão em 20/08/2020, página A2, acessível no www.conselhobrasilnacao.org, trecho citado no “PAPER”91, a seguir transcrito, foi corajoso por avaliar mais de três décadas de uma orientação política que requer mudança. Já decorreu tempo considerável no qual o País não está dando certo, vale o alerta de Einstein: por que continuar fazendo a mesma coisa, ou seja, obedecendo a mesma Constituição que é a Carta produto da Nova República?
(…) “Se a Nova República em vários aspectos foi positiva — propiciou o controle da inflação, construiu um sistema de freios e contrapesos que bem ou mal funciona e sobreviveu a testes de estresse com a destituição de dois presidentes —, por outro lado pouco fez para acabar com privilégios da corte estatal, minou a credibilidade da política com um sistema de representação e de governança que convida à corrupção e fracassou na redução da nossa brutal desigualdade. Com isso temos uma classe média que mal se identifica com a política e se sente injustiçada. E temos também um imenso contingente de pobres dependentes de caraminguás do Estado, condenados a uma permanente subalternidade.
A Nova República, com suas promessas democráticas e espírito conciliador, vem passando pelo maior questionamento de suas quase quatro décadas de história. O que sairá disso depende em grande medida da vontade do País de se entender sobre o que afinal quer da democracia.”
Em 27/03/2020, página A2 do Estadão, sob o título “Nacional-populismo”, artigo do advogado e professor Titular Sênior da Faculdade de Direito da USP, Miguel Reale Júnior, do qual transcrevemos parte a seguir:
(…) “As manobras antes utilizadas em face do consumidor passaram a ser aplicadas ao eleitor, objeto de cooptação para levar ao poder ambiciosos sem pudor, falsos moralistas que prometem expulsar os maus do “templo” valendo-se do ressentimento e da raiva fáceis de ser explorados, sempre sob a ótica conspiratória contra bodes expiatórios denunciados com ‘fake news’ nas redes sociais.
Adotam esses chefes autoritários posições diversas a cada passo. Dizem um dia o necessário para contentar parcela Y da sociedade, para no seguinte, sem preocupação com a coerência, aderirem ao inverso, se preciso, para satisfazer a parcela X.
No caso brasileiro, o desencanto com a corrupção após a ditadura, a desesperança de dias melhores após a nova Constituição, bem como a crise de segurança pública facilitaram um discurso raso de direita e a indicação dos culpados: a classe política, acusada de só ver o próprio interesse, as elites traidoras, o aparelhamento do Estado.
A eventual frustração de cada qual nos planos profissional, econômico, sexual, familiar se soma à indignação dos eleitores contra o PT, a corrupção, o Congresso, o STF, muitos sem perceber que ir contra os dois últimos lesa direitos fundamentais e instaura o arbítrio.” (…)
O sociólogo e membro da Academia Brasileira de Ciências, Simon Schwartzman, em artigo do Estadão de 09/10/2020, página A2, sob o título “Democracia em crise”, apresenta estudo profundo da situação política, concluindo a seguir, conforme transcrição parcial:
(…) “A democracia está em crise. O fato de termos um presidente que não acredita nela aumenta o problema, mas é mais uma consequência do que sua causa. A crise da democracia tem origens mais profundas. Primeiro, pelo número crescente de grupos e setores capazes de se organizar e pressionar por seus interesses. Segundo, pela explosão das comunicações, que tornou impossível manter a distância que protegia as ações da administração pública da vigilância da opinião pública.” (…)
(…) “No Brasil, o governo federal, depois de flertar com a ruptura autoritária, acabou se acomodando a um nível extremamente baixo de ‘normalidade’, com grande dificuldade de tomar decisões, a um custo preocupante para a economia, a sociedade, a saúde pública e o meio ambiente.
A democracia tem um antídoto para isso, que é renovar o pacto entre governo e sociedade, com a eleição de governantes com competência, legitimidade e autoridade suficientes para tomar as decisões que sejam necessárias, sem se submeter ao varejo do dia a dia, tornando a economia previsível e implementando políticas sociais de qualidade. Nem sempre funciona, e as próximas eleições vão nos dizer se teremos chances de seguir esse caminho, ou se continuaremos afundando.”
CONCLUSÃO:
Melhor plano não é aguardar novamente pela sorte nas urnas, dadas as atuais condições constitucionais e legais, que terão de ser obedecidas, e assim os problemas atuais, o atraso e a POBREZA, não se resolverão. É preciso leitura correta da história: o que foi acima exposto por diversas e respeitáveis personalidades é produto da Nova República. É preciso outra República.
Desenvolvimento econômico do País, dentro de condições sociais dignas e humanas, requer governança pública eficaz e eficiente, o que depende de bons governantes e de operação das finanças públicas em regime de equilíbrio orçamentário (Receita maior ou igual às Despesas).
Atender a essas condições implica um Plano Econômico Estratégico para o Brasil, o qual inclua novas disposições constitucionais e legais para:
- Possibilitar a eleição de bons governantes, o que depende da reorganização da política (democracia eleitoral e cidadania na prática do bem comum, e do interesse nacional – ver “PAPER”35);
- Reduzir o custo do Estado, no que for possível, preservadas condições mínimas humanas e sociais, pela transformação estrutural num Federalismo descentralizado, capaz de trazer o poder para próximo das decisões dos cidadãos, com compromisso de eficiência e eficácia nos gastos públicos;
- Estruturar o Sistema Produtivo comprometido com os objetivos e interesses nacionais de elevar o patamar do PIB, implementando capacitação competitiva para atuação nos mercados externos. A prática do equilíbrio orçamentário depende das decisões que reduzam o custo do Estado e aumente a receita tributária, a qual é função do PIB.
O instrumento essencial é combater a POBREZA; para o que o País deve se habilitar para dar ocupação laboral a seus habitantes, como os asiáticos já demonstraram ao mundo. O trabalho, além da inclusão social coloca o cidadão em contato com o mundo, é o motor propulsor de êxito educacional da população e de ganhos de produtividade da economia; a educação por si só não se realizará, a despeito de tantos se ocuparem dessa tese com conceitos falhos.
É necessário haver a ambição dos pais, de que seus filhos tenham melhor sorte que eles, e para tanto dedicarão seus esforços para ganho de produtividade profissional individual, assim contribuindo para o aumento da produtividade da economia como um todo.
Aqui reside um conceito falho, comumente empunhado, de pretender crescimento de produtividade, dissociado do interessado. Um dos melhores exemplos vem dos asiáticos, que cuidaram da educação, porém precedida pela ocupação laboral, que pressiona e gera oportunidade de melhoria de vida. O sucesso econômico e social de um país é a prosperidade de seus habitantes.
A prosperidade liberta e engrandece a pessoa. O paternalismo é a desgraça das nações; entorpece e paralisa as mentes. É mais fácil ser coitadinho do que ser empreendedor.
A democracia fundada no Estado de Direito e na cidadania não é uma estação de chegada, mas uma maneira de viajar, visando desenvolvimento econômico, político, cultural e social para transformar o Brasil na melhor nação do mundo para se viver bem.