Retomada na indústria continua
Após dois meses de reação, a indústria continuou abaixo do patamar de fevereiro
Notas & Informações, O Estado de S.Paulo – 08 de agosto de 2020 | 03h00
Dois meses de forte expansão – 8,2% em maio e 8,9% em junho – foram insuficientes para levar a produção industrial de volta ao patamar de fevereiro. Apesar da ampla reativação, liderada pelo setor automobilístico, a indústria fechou o primeiro semestre sem ter conseguido eliminar a queda de 26,6% acumulada em março-abril.
O tombo resultou do primeiro grande impacto econômico da pandemia do coronavírus. Mesmo com a reação, o volume produzido em junho foi 9% menor que o de um ano antes e o total de 2020 ainda ficou 10,9% abaixo do registrado na primeira metade de 2019, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Sinais de melhor disposição do empresariado complementam o quadro de retomada, mesmo num ambiente ainda muito inseguro. Em julho, o Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei) subiu em 29 dos 30 segmentos considerados na pesquisa mensal da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Na indústria de transformação o indicador cresceu pelo terceiro mês consecutivo e chegou a 49,1 pontos, quase atingindo a linha divisória de 50 pontos. Essa é a fronteira entre as zonas de otimismo e de pessimismo.
Na média, portanto, a melhora de humor do empresariado do setor de transformação aponta uma redução do pessimismo. Entre os poucos segmentos acima da divisória, destacam-se produtos de limpeza, perfumaria e higiene pessoal (56,7) e produtos farmoquímicos e farmacêuticos (55,4). Não surpreende, neste momento, o otimismo nesses tipos de indústria. Também na zona positiva aparecem, com destaque, os segmentos de móveis (53,7) e de produtos de borracha (53,4).
Embora liderando a retomada no cenário do IBGE, com aumento de produção de 70% em junho, a indústria de veículos aparece em posição ainda muito retraída no quadro de confiança da CNI. Neste conjunto, a evolução foi de 40,5 pontos em junho para modestos 44,3 no mês seguinte. O cenário fica mais claro quando se considera o tombo sofrido pelo setor. Em dois meses de retomada, a produção da indústria de veículos automotores, carrocerias e reboques aumentou 495,2%, mas ainda ficou 53,7% abaixo do patamar de fevereiro.
Em março e abril o segmento de veículos e produtos vinculados havia ficado quase totalmente paralisado. A fabricação acompanha a recuperação da demanda interna, ainda muito fraca. Em julho, a venda de veículos novos foi 43,6 maior do que em junho, com emplacamento de 279.103 unidades, incluídos veículos leves e pesados, mas o total foi 20,1% inferior ao de um ano antes, segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave).
Quanto à exportação, continua travada, principalmente por causa da crise na Argentina, maior mercado importador de veículos fabricados no Brasil. Já emperrada há alguns anos, a economia argentina ainda se enfraqueceu com a chegada do novo coronavírus. Outros importantes mercados latino-americanos também foram severamente afetados pela pandemia.
Entre janeiro e julho a exportação brasileira de veículos de passageiros foi 48,9% menor que a de um ano antes, em valor, pela média dos dias úteis, segundo o Ministério da Economia. No caso dos veículos para transporte de mercadorias e usos especiais, a diferença, para menos, ficou em 43,5%. Como a fabricação de veículos e máquinas agrícolas e rodoviárias demanda enorme volume de matérias-primas e bens intermediários, a crise nas montadoras se irradia por uma ampla teia de empresas fornecedoras. Daí a importância da recuperação, embora ainda insuficiente, da indústria automotiva.
Os danos da pandemia ainda serão percebidos por algum tempo, mas seria um erro atribuir os males da indústria apenas à crise do coronavírus. O setor já andava mal bem antes da covid-19. Entre novembro e fevereiro a produção de cada mês havia sido sempre inferior à de um ano antes. Com o desastre econômico precipitado pela doença, esse quadro se prolongou. Durante oito meses, até junho, o desempenho foi pior que o do mês correspondente do ano anterior. Mas a indústria se move e é preciso apostar na retomada.
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