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Fundeb deve favorecer 17 milhões de novos alunos

Além de aumentar a quantidade de recursos que a União passa a depositar no fundo de financiamento do ensino, mudou-se a distribuição, destinando mais dinheiro a municípios mais pobres. Estimativa é de que 2.745 redes de ensino receberão mais recursos.

O Estado de S. Paulo – 22 Jul 2020 – Renata Cafardo Camila Turteli

Ao prorrogar ontem o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), a Câmara alterou profundamente o principal mecanismo de financiamento das escolas públicas do País. A quantidade de recursos que a União passa a depositar no fundo aumenta e os municípios mais pobres passam a receber mais dinheiro. Com a mudança, 17 milhões de alunos a mais serão beneficiados até 2026 pela chegada de recursos a suas escolas.

Em um dia considerado histórico para os educadores e com uma derrota do governo, a Câmara aprovou ontem a prorrogação do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), principal mecanismo de financiamento das escolas públicas do País. Além de aumentar a quantidade de recursos que a União passa a depositar no fundo, o novo formato diminui a desigualdade, destinando mais dinheiro aos municípios mais pobres. Com as mudanças, 17 milhões de alunos a mais serão beneficiados no País, com recursos para as escolas em que estudam.

O Fundeb foi criado em 2007 e expirava no fim deste ano, mas o governo Bolsonaro se recusou a discutir a prorrogação até a véspera da votação, o que chegou a colocar o mecanismo em risco. No sábado, o governo quis destinar recursos do fundo renovado ao Renda Brasil, que ainda está sendo desenhado pela equipe econômica para substituir o Bolsa Família, para driblar o teto dos gastos federais (que não atinge o Fundeb), e ainda limitar o gasto com salário de professores.

O fundo funciona como uma conta bancária que recebe 20% do que é arrecadado em impostos, na maioria estaduais, como ICMS e IPVA. Até agora esse dinheiro era dividido pelo número de alunos em cada Estado. O resultado dessa conta não podia ser inferior ao valor mínimo por estudante estipulado pelo governo federal, cerca de R$ 3 mil – agora ele pode chegar a R$ 5,7 mil. Os Estados mais pobres ganhavam ajuda financeira da União, que representava 10% do Fundeb.

Com a aprovação de ontem, o governo federal passa a responder por 23% do total dos recursos, que vão aumentar gradativamente durante seis anos. Em 2021, serão 12% e em 2022, 15%. Depois, crescerão em dois pontos porcentuais a cada ano. Além disso, 2,5% irão para municípios que tiverem melhores resultados de aprendizagem, mas os detalhes ainda serão definidos em lei complementar.

Outra mudança é que a lógica, que era estadual, passa a ser municipal. Atualmente, municípios pobres em Estados ricos não recebiam essa complementação da União. Segundo cálculos do Todos pela Educação, em seis anos, 17 milhões de alunos e 2.745 redes de ensino a mais receberão dinheiro para aumentar o quanto investem por estudante.

“Com essa arquitetura redistributiva, se alcança mais municípios. Caso contrário, a União teria de colocar muito mais dinheiro”, diz a presidente do Todos pela Educação, Priscila Cruz. “É um momento histórico. Vai se dar mais para quem mais precisa e menos para quem menos precisa.” Ela considera o aumento da complementação para 23% “algo espetacular”. Parte desse dinheiro, 5,25%, terá de ser destinada apenas para a educação infantil, principalmente para aumento de vagas nas creches.

Originalmente, a proposta da relatora Dorinha Seabra (DEM-TO) previa ampliar a complementação da União, partindo de 15% em 2021, chegando a 20% até 2026. Em 2019, o Fundeb movimentou R$ 156 bilhões, sendo R$ 14 bilhões da União. Cada ponto porcentual a mais representa cerca de R$ 1,5 bilhão.

Choro. Durante a leitura do relatório, Dorinha elogiou o empenho do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que chegou a chorar. Foram 499 votos a favor e apenas 7 contra, só de deputados bolsonaristas. A Câmara votava na noite de ontem os destaques (pedidos de alteração) e depois o segundo turno. Posteriormente, a proposta segue para o Senado. Nos últimos dias, a proposta foi discutida entre o ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Dorinha. A equipe econômica defendia uma complementação de 22%, com 4% para os benefícios à primeira infância.

Outra proposta do governo rechaçada pela Câmara era que a PEC só tivesse validade a partir de 2022, deixando um vácuo durante 2021. Era questão de discordância também a proibição do uso de verbas para o pagamento de aposentados e pensionistas. O governo queria permitir isso. Todos esses pontos levaram os partidos do Centrão a protocolarem seis requerimentos de obstrução para atrasar a votação, mas eles foram retirados antes do início da sessão.

“Vamos assegurar pela primeira vez que a educação infantil tenha prioridade”, disse Dorinha. “Hoje queremos escola boa com profissionais respeitados.” A relatora estabeleceu também no texto aprovado a revisão do Fundeb a cada dez anos, que era uma das demandas do governo. Dorinha manteve o piso de 70% como o mínimo a ser aplicado no salário de professores, e não o máximo, como a equipe econômica queria. Esse ponto, no entanto, pode ainda ser modificado nos destaques.

A relatora também determinou que o padrão mínimo de qualidade do ensino garantido pela União, por meio de assistência a Estados e municípios, deve ter como referência o custo aluno qualidade (CAQ), um parâmetro de financiamento educacional previsto no Plano Nacional de Educação (PNE).

“Nos últimos dias, alguns grupos surgiram para dizer que esse não era o momento para aprovar o Fundeb, pois estamos passando por uma grave crise econômica e fiscal. Se enganam aqueles que pensam que educação não pode contribuir com a superação da crise que estamos vivendo, serão nossas escolas públicas que acolherão os estudantes”, afirmou a deputada Tabata Amaral (PDT-SP), que se disse emocionada “nesse dia histórico”.

“Nós estamos deixando claro na Constituição que não vamos sossegar enquanto tiver um brasileiro ainda sem acesso à educação”, disse a deputada Soraya Santos (PL-RJ). Parlamentares do PSOL destacaram a atuação de professores nas redes sociais durante o dia para garantir a aprovação da proposta. “Estamos falando de um programa para incluir milhões de jovens fora da escola e valorizar professores”, afirmou Sâmia Bomfim (PSOL-SP).

Repercussão

“É um momento histórico. Vai se dar mais para quem mais precisa e menos para quem menos precisa.”

Priscila Cruz

TODOS PELA EDUCAÇÃO “Vamos assegurar pela primeira vez que a educação infantil tenha prioridade.”

Dorinha Seabra (DEM-TO)

RELATORA

“Se enganam aqueles que pensam que educação não pode contribuir com a superação da crise que estamos vivendo.”

Tabata Amaral (PDT-SP)

ARTIGO468

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