Mídias,  Paper

PAPER 128: Projeto de País (EU SOU BRASIL!!!)

Tema: “A Nação brasileira e a credibilidade das instituições.” (2)

“As elites da América Latina só conseguem se sentir ricas rodeadas de pobres.”

Victor Bulmer-Thomaz, cientista político inglês.

 

Em maio próximo passado, ao divulgar o “PAPER” 119, abordamos um tema muito importante para nós brasileiros: a credibilidade das instituições. Por um lado, temos verificado que nossas instituições falham muito, no que se refere ao cumprimento de suas competências constitucionais ou legais, sendo previsíveis as consequências desse não cumprimento; e, por outro lado, as autoridades responsáveis por nossas instituições se vangloriam alegando que as mesmas estão funcionando, sem perceberem que não têm sido aperfeiçoadas, pois em essência rigorosamente elas tem deixado a desejar, o que se comprova pelo permanente estado de crises, com destaque para os últimos 100 anos, inclusive nos dias atuais. Essas crises são nocivas ao desenvolvimento econômico e tudo que decorre disso: POBREZA, atraso, violência. Em pesquisa da “Genial/Quaest” realizada entre os dias 26 e 29/08/2021, a avaliação positiva foi STF (19%), Senado (14%) e Câmara (13%).

O “PAPER” 14, de 05/02/2018, cujo tema é “Instabilidade política e econômica”, resumiu as crises desde 1930 até aquela data. Agora, em 21/09/2021, o Estadão, na página A2, divulga artigo de autoria do Dr. Almir Pazzianotto, sob o título “Semipresidencialismo”, disponível no “site” www.conselhobrasilnacao.org, que relata minuciosamente e com riqueza de detalhes a história política do Brasil no referido período. Em artigo no Estadão de 30/09/2021, página B6, o professor da FEA/USP e pensador respeitado José Pastore sob o título “O Brasil é vítima de seu Congresso” diz: “(…) O que terá ocorrido aos senadores que decidiram punir os brasileiros de maneira tão maldosa? (…)” “(…) Mas que fique claro: os demais Poderes da República não estão livres de decisões em causa própria e à custa do sofrimento dos mais pobres. Não é à toa que os brasileiros que “confiam muito” no Poder Executivo são apenas 16%; no Judiciário, são 15%; no Legislativo, 4%; nos partidos políticos, 3% (Datafolha 26/9/2021).”

O “PAPER” 23, de 22/07/2018, sobre o tema “Cuidado com Estado de partido único”, que se baseia nas advertências do professor de História da Universidade de Yale, Timothy Snyder ao abordar a tese objeto de seu livro “SOBRE A TIRANIA” (Vinte lições do século XX para o presente), é aqui lembrado, porque os Partidos Políticos brasileiros não têm distinção ideológica (por isso agem como um só, essencial e visivelmente visando interesse direto apenas de seus integrantes partidários ou do stablisment burocrático). E essa instituição Partido Político é exatamente a que deveria fazer crítica construtiva e liderar o aperfeiçoamento das instituições.

A conclusão do “PAPER”23: “PENSEM enquanto é tempo. As propostas dos candidatos nas eleições de 2018 até agora apresentadas não estão à altura das necessidades do Brasil de hoje. As manifestações do professor Ives Gandra Martins, da economista Ana Carla Abrão, do professor Alex Agostini, do escritor e jornalista Fernão Lara Mesquita, do professor Timothy Snyder, e tantos outros importantes pensadores como o cientista político Bolívar Lamounier, sociólogo Luiz Werneck Vianna, professora da FGV Aspásia Camargo e cientista José Goldemberg, nos advertem que a sociedade brasileira não deve continuar inerte e omissa, pois já nos ensinava Platão, “A punição aos bons omissos é serem governados pelos maus que agem”. Os problemas momentosos não estão sendo tratados como “o que fazer”. Depois será tarde; e esse tarde pode estar muito perto.”

E não é só: já fomos advertidos também pelo Embaixador Rubens Ricupero, citado em nosso “PAPER” 54, cujo tema é “Um futuro pior que o passado?”, em conferência na Academia Brasileira de Letras, bem como pelo professor de Ciência Política Franciso Ferraz, ex-Reitor da UFRGS, em seu artigo “Enquanto dormia Gulliver foi amarrado…”, divulgado pelo Estadão em 16/05/2018 que reproduzimos na íntegra a seguir:

“Crises fazem grandes líderes, construtores de suas nações… Mas não no Brasil.

‘Depois do naufrágio, Gulliver com muito esforço consegue chegar à praia. Atira-se ao chão e adormece profundamente.

Ao acordar não consegue se mover. Estava amarrado ao chão dos pés à cabeça, inclusive pelos cabelos’

‘Viagens de Gulliver’, Jonathan Swift, 1726

Mais recentemente, quando penso no Brasil vejo a imagem de Gulliver amarrado ao chão. Somos neste 2018 um Gulliver atado. Enquanto dormíamos o tempo passou e com ele, as oportunidades. Embora gigante, não conseguimos nos livrar das amarras com que os habitantes de Liliput – homenzinhos de uns 15 cm de altura – nos prenderam.

Por que não conseguimos nos livrar das amarras? Porque nós mesmos, na inconsequência de quem acha que sempre haverá tempo, nos entregamos a uma política sem grandeza que nos levou à paralisia. Amarrados a uma crise de natureza social, política, econômica e cultural, desativamos as defesas com que podíamos vencer a crise.

Crises são desafios que devem convocar o melhor que temos para enfrentá-las. São oportunidades que fazem surgir líderes com lucidez, coragem, persistência e visão. Infelizmente, precisamos buscar esses líderes na História e em outras nações. São indivíduos que, como Lincoln, Gandhi, Churchill, De Gaulle, Roosevelt, estiveram à altura do momento em que lideravam seus povos. Crises fazem grandes líderes, alguns até mesmo construtores de suas nações… Mas não no Brasil.

Não podemos usar a crise como alavanca para o avanço por que não podemos contar com nossas instituições políticas: os três Poderes estão amarrados como Gulliver.

Senadores e deputados, o Executivo e seus ministérios perderam as condições para resolver a crise. Preocupam-se com os processos em que estão envolvidos e na reeleição. Protelam decidir matérias de gravidade como a Previdência. Não bastasse, o STF, pelos conflitos pessoais e políticos que abriga, se autobloqueia.

Como superar uma crise dessa gravidade se vivemos uma batalha surda em que grande parte dos valores indispensáveis à convivência social e a uma cultura política democrática são desprezados e contestados, dividindo a Nação em blocos antagônicos?

Nossa política foi penetrada por práticas e princípios que se opõem abertamente aos valores centrais de qualquer democracia. Nossa política deixou em segundo plano a discussão sobre políticas públicas para discutir a própria organização da sociedade. Abriram-se então as comportas para que todos os valores que regulam a vida social entrassem em questionamento: família, religião propriedade, crime, liberdade de imprensa, mercado, competição, democracia representativa, livre-iniciativa, educação, liberdade de imprensa, responsabilidade individual, mérito.

Pratica-se aberta e ostensivamente uma política em que as ideologias penetram todas as esferas da vida como uma nova ética; em que as relações pessoais e familiares são inferiores em importância às relações fundadas na ideologia; em que todo aliado é virtuoso e bem-intencionado e todo adversário é mal-intencionado e criminoso; em que se nega a existência de princípios absolutos na moral e na religião; em que se confunde educação e doutrinamento; e na qual o objetivo buscado legitima qualquer ato que contribua para atingi-lo.

Não são poucos os que argumentam que toda disciplina é odiosa; toda autoridade legal é ilegítima; que a liberdade verdadeira só existe quando há igualdade absoluta; que a responsabilidade é um conceito perigoso porque provoca desigualdades e individualiza situações que deveriam ser coletivas; que toda diferença social é uma exploração; que o mérito é um critério pernicioso por provocar a discriminação e a desigualdade; que todo delinquente é vítima; que a verdade e todas as demais virtudes são relativas.

Já se diz entre nós que obedecer e fazer obedecer à lei e punir criminosos faz mal à economia do País; que, dependendo de quem é acusado, a culpa é absolvida pela intenção; em que “se eu fiz, mas tu também fizeste” estamos iguais, nenhum pode acusar o outro e eu estou inocentado.

Já se pratica uma política em que a lei vigente poderá ser respeitada sempre que for politicamente conveniente, caso contrário ela deverá ser assediada e contestada continuadamente para desgastá-la e derrogá-la na prática. Neste contexto, a qualidade da discussão política cai dramaticamente: o grito equipara-se ao argumento, a coerência é substituída pela desfaçatez, a ousadia afasta a prudência; a mentira se impõe como verdade; a publicidade se encarrega da persuasão.

Esta listagem nem se tornou ainda universal em nossa cultura política, nem esgota as linhas de conflito nessa batalha política pelos corações e mentes dos brasileiros. Vivemos, se me é permitida a ousadia de afirmar, uma “situação constituinte”, por via da qual normas são derrogadas e caem em desuso pelas manifestações de rua e pela ousadia dos atrevidos, perante as quais os Poderes se submetem pelo silêncio.

Esta listagem, embora reduzida, dá uma ideia do quanto nós avançamos na destruição dos fundamentos de uma sociedade democrática, próspera e civilizada. Ela nos alerta para o quanto já foi perdido e será necessário recuperar.

O fato é que muitas de nossas escolhas foram erradas e, quando não erradas, fracas; nossas decisões sempre evitam o custo político das ações; nossa percepção do tempo é singular: vivemos um presente fugaz, mas sem sacrifícios; para trás está o território das heranças malditas e para a frente, o futuro que certamente será glorioso, ainda que nada façamos para realizá-lo. No tempo presente nossa convicção mais profunda é de que o Estado sempre terá recursos para bancar a despesa pública; a tarefa do governo, então, é distribuir, não estimular a produção, e quando faltar aumenta-se a despesa e se compensa tirando a gordura dos que têm mais.”

 

CONCLUSÃO:

Os líderes brasileiros devem o quanto antes ouvir o clamor não verbalizado, porém expresso de forma eloquente, no quadro de carência ou mesmo miséria, e, portanto, vulnerabilidade, em que vivem grandes contingentes humanos, de falta de ocupação laboral, que impede as famílias de obterem renda suficiente para sobreviver e para viabilizar um futuro melhor.

A solução é a realização do desenvolvimento econômico, que depende da parceria dos dirigentes públicos e da classe política com os empreendedores e os líderes da sociedade civil, irmanados por princípios éticos sob o prisma do bem comum de espírito público e de convivência social civilizada.

As instituições mais importantes na democracia representativa são os Partidos Políticos (veja-se o que está acontecendo no Chile e na Alemanha, no momento) – a proposta definida no “PAPER” 35, de 15/01/2019 que prioriza o aperfeiçoamento do ordenamento político-partidário –, cuja implementação depende de muita atenção e firmeza de propósito, sem se perder o foco dos objetivos de interesses nacionais calcado no bem comum, capazes de nos conduzir a portos seguros.

É preciso evitar o que aconteceu com a ilusória renovação política de 2018 em que os novatos do Congresso Nacional ainda não provaram a que vieram, após 1.000 dias de mandato, comprovando que o artigo do professor Francisco Ferraz é atual, embora datado de 16/05/2018, validando o conceito de que o aperfeiçoamento das instituições TEM DE SER PRECEDIDO DA RENOVAÇÃO NOS PARTIDOS POLÍTICOS.

É importante que a sociedade civil como um todo, os chefes de família, seguidos pelos líderes políticos, empreendedores da livre iniciativa, associações de classe, sindicatos e líderes em geral não aceitem a tergiversação, a negligência, a indiferença, a acomodação e omissão, porque rápido o tempo avança e os problemas crescem, intocados ou lançados para “debaixo do tapete”. “É fácil livrar-se das responsabilidades. Difícil é escapar das consequências por se ter livrado delas.”, segundo Graciliano Ramos (1892-1953), romancista. A crise deve ser evitada e, quando não for possível, enfrentada e superada, ao contrário do que temos assistido ao longo de nossa História: assimilação, acomodação.

A oportunidade das eleições gerais no ano do bicentenário da Independência do Brasil é ainda um VAZIO a ser ocupado pelo espírito e propósito renovador capaz de transformar nossas instituições, valendo lembrar do alerta de Platão: “A punição aos bons (omissos) é ser governados pelos maus (que agem).” E para os bons: “O mundo só será salvo quando dermos aos bons suficiente maldade para impor aos maus sua bondade.”, conforme citação de Millôr Fernandes.

A democracia fundada no Estado de Direito e na cidadania não é uma estação de chegada, mas uma maneira de viajar, visando desenvolvimento econômico, político, cultural e social para transformar o Brasil na melhor nação do mundo para se viver bem.

Personalidades autoras de artigos e citações neste “PAPER”:

– Almir Pazzianotto Pinto, advogado e ex-ministro do trabalho;

– Francisco Ferraz, cientista político e ex-Reitor da UFRGS;

– Graciliano Ramos, romancista;

– José Pastore, professor da FEA/USP;

– Millôr Fernandes, humorista, escritor e jornalista;

– Platão, filósofo

– Timothy Snyder, professor de História de Yale (EUA);

Print Friendly, PDF & Email

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *