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‘Governo e agro precisam sintonizar o discurso’, afirma Roberto Azevêdo

Eleições no Parlamento Europeu devem aumentar dificuldades para os produtos brasileiros no exterior Ex-embaixador de carreira do Itamaraty, foi diretor-geral da OMC e hoje é sócio na YvY, gestora de investimentos verdes

Por Mariana Carneiro, O Estado de S. Paulo, 06/07/2024

Ex-diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC) e ex-vice-presidente global da PepsiCo., Roberto Azevêdo vê riscos crescentes de um aumento do protecionismo na Europa e nos Estados Unidos em razão das eleições. A força demonstrada pelos agricultores nas eleições do Parlamento Europeu e o desgaste da agenda ambiental climática, em sua visão, são fatores desfavoráveis ao agronegócio brasileiro. “Essa necessidade de proteger o agricultor europeu me faz imaginar que outras formas de proteção serão aplicadas fora da fronteira”, diz, lembrando que a União Europeia vai continuar exportando padrões europeus de produção, de resíduos e de desmatamento, que implicará custos ao produtor estrangeiro – entre eles, o brasileiro.

Azevêdo sugere um diálogo aberto entre o governo Lula e os produtores para a construção de uma agenda que mostre que o agro brasileiro pode ajudar na agenda climática. “O setor privado está disposto a fazer esse tipo de diálogo. Mas espera que o governo faça a sua parte de contribuir, de entender a realidade do produtor brasileiro, de entender os desafios e as oportunidades que estão se apresentando. Dessa conversa, pode sair uma boa estratégia para a atuação na COP-30.”

Ex-embaixador de carreira do Itamaraty, Azevêdo é hoje sócio na YvY, uma gestora de investimentos verdes que tem entre os sócios o ex-ministro da Economia Paulo Guedes e o ex-presidente do BNDES Gustavo Montezano. Neste momento, ele assumiu uma nova missão: ser o embaixador do agronegócio brasileiro no exterior, a trabalho da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) no comércio internacional. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Em quais temas internacionais o agronegócio brasileiro deve ficar atento neste momento?

É entender o que as mudanças e a nova configuração política europeia e a possível nova configuração política nos Estados Unidos podem significar, e como nós usamos as oportunidades que temos pela frente para dar as mensagens corretas e a sinalização correta, como preparação para esse cenário internacional.

Qual a consequência de curto prazo?

O que acontece na Europa é que o protecionismo perpassa todos os espectros políticos. Não tenho dúvidas de que continuará uma pressão muito grande, e a exportação de uma narrativa de que os países desenvolvidos e a Europa, em particular, fizeram o seu dever de casa, e os outros não. Então, haverá uma pressão ainda maior para que os outros países, sobretudo os países em desenvolvimento, que têm menos recursos para investir na área de sustentabilidade, façam a transição para uma economia verde e sustentável. Isso, no fundo, é uma exportação de custos.

O que isso significa para o agricultor brasileiro?

Eu acho que piora. Você está colocando na agenda climática o elemento de proteção ao agricultor comunitário (europeu), porque ele diz que está sofrendo com essa agenda (climática). Ele tem os custos aumentados, a sua competitividade é reduzida – portanto, ele precisa de proteção. E a Comissão Europeia abraçou esses argumentos. Então, está flexibilizando para eles, tentando reduzir os custos, e dando a proteção de que eles dizem que precisam para atender aos requisitos da transição para a economia verde.

Seu prognóstico é de que haverá mais protecionismo.

Sim, mas é importante dizer também que não é uma novidade, porque as exportações agrícolas brasileiras são muito competitivas. Há uma modernização extraordinária em curso no agronegócio brasileiro, que não só está sendo mais produtivo, mas está sendo mais produtivo com menor pegada de carbono. Pouco disso, no entanto, será reconhecido se nós esperarmos que isso venha de graça. Não virá de graça. Por isso, precisamos usar os momentos que temos pela frente para, justamente, apresentar essa face do agronegócio brasileiro como potencial solução para o problema climático, e não como um problema em si. Por exemplo, na COP-30 (em 2025, em Belém) é uma oportunidade de ouro para o Brasil.

O presidente Lula sempre defendeu o agronegócio brasileiro com a agenda de expansão do etanol no mundo. Agora, com a polarização política, há uma distância entre o agronegócio e o governo. Isso atrapalha?

Eu acho que, para a gente chegar lá, nós vamos ter de ter muita conversa. Porque essa é uma agenda que é necessária para o Brasil, independentemente da orientação política. O setor privado está disposto a fazer esse tipo de diálogo. Mas espera que o governo faça a sua parte de contribuir, de entender a realidade do produtor, de entender os desafios e as oportunidades que estão se apresentando. Dessa conversa, pode sair uma boa estratégia para a atuação na COP-30.

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