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Especialistas criticam ‘nova’ CPMF

De volta ao debate público após o avanço da reforma da Previdência na Câmara, a mudança no sistema tributário brasileiro ainda tem pouco consenso entre especialistas. Um deles é a forte crítica à criação de um imposto sobre movimentações financeiras nos moldes da extinta CPMF, tido como ineficiente e já abandonado por alguns países que chegaram a adotá-lo.

“Para Maciel, o modelo do IVA olha o passado e ignora a digitalização da economia”

“Diversos estudos mostram que a CPMF aumenta as transações com moeda, reduz a oferta de crédito e gera menor crescimento da indústria”, afirmou ontem o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper, em debate do Valor e do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO).

O governo estuda adotar uma contribuição sobre pagamentos (CP) para substituir a contribuição previdenciária das empresas, de 20% sobre a folha de salários.

Para o presidente do ETCO, Edson Vismona, a medida pode inviabilizar a operação de empresas com menos empregados. Com quadros mais enxutos, a desoneração na folha teria impacto limitado e não compensaria a CP.

Roberto Quiroga, professor de direito tributário da USP e da FGV Direito-SP, pondera que, para empresas, trocar certos impostos por uma espécie de CPMF pode ser bom. “Como opção, em muitos casos, é mais benéfico.”

Há mais divergências sobre qual sistema deve substituir o atual. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 45, de 2019, protocolado pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP), prevê a criação de um imposto sobre o valor agregado, que unificaria três tributos federais (IPI, PIS e Cofins), o ICMS (estadual) e o ISS (municipal). A ideia é de Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF).

Vista por Lisboa como melhor opção do que a recriação de uma CPMF, o plano é criticado por Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal. Em sua avaliação, o modelo do IVA olha o passado e ignora a digitalização da economia. “Trata-se de imposto obsoleto, criado em 1949, absolutamente incapaz de lidar com o mundo digital, que está pensando no pós-tributação.”

Além disso, Maciel aponta que, do modo como está, a proposta de reforma vai elevar a carga tributária para muitos setores e reduzir a de poucos. “Como a carga tributária deve ficar constante, quem vai pagar essa conta são os 850 mil contribuintes que estão no lucro presumido.”

Nessa lista, entram pequenos prestadores de serviços e comerciantes e setores de construção, radiodifusão e agrícola, enumerou Maciel. Há ainda incertezas sobre segmentos, submetidos ao PIS/Cofins, como fármacos, combustíveis, bebidas e tabaco. O efeito direto, ele diz, seria aumentar a sonegação, principalmente em serviços corriqueiros, como consultas médicas.

Segundo Lisboa, do Insper, o atual sistema tributário é uma das causas do baixo crescimento do Brasil. “A maneira como você faz a regra tributária determina se o país vai crescer ou não”, disse. Se há duas décadas o mundo cresce mais do que o Brasil, algo está errado aqui, destaca.

De acordo com o economista, o debate sobre mudanças nos impostos deve ser pautado por alguns princípios. Uma vertente deles é evitar erros do passado, sobretudo os da gestão de Dilma Rousseff na concessão de benefícios fiscais. “Tudo o que você faz via incentivo tributário, é melhor fazer via gasto público.”

Nessa concepção, todos os setores teriam o mesmo patamar de tributação e eventuais incentivos seriam discutidos no Legislativo, garantindo mais transparência. Isso, pontua o economista, não impediria que cada Estado adotasse uma política industrial, por meio do gasto público direto.

Outro pressuposto deveria ser a criação de uma regra o mais abrangente possível, com poucas exceções. Segundo Lisboa, o Brasil é especialmente disfuncional no detalhamento das regras tributárias, o que leva a um enorme volume de disputas judiciais.

Para o economista, o ideal seria adotar microrreformas desde já nessa seara, principalmente nas chamadas instruções normativas, que mudam com frequência detalhes do sistema tributário. “O secretário de Fazenda tem caneta para fazer isso.”

O alto volume de disputas judiciais envolvendo impostos também preocupa o procurador-geral-adjunto da Fazenda Nacional, Phelippe Toledo Pires de Oliveira. “Precisamos pensar a reformulação da execução fiscal, hoje fadada ao insucesso, o que incentiva o mau pagador.”

Só no Carf, a última instância administrativa, há hoje 150 mil processos, segundo Oliveira. Se nenhum mais processo fosse aberto, o tribunal levaria dez anos para julgar todas as demandas.

Na visão de Oliveira, a reforma tributária ideal deve respeitar o pacto federativo, promover simplificação tributária e respeitar os direitos dos contribuintes.

Para Quiroga, a criação de um comitê gestor para gerenciar os recursos arrecadados através do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), como prevê a PEC nº 45, “ofende o princípio federativo”. “Vejo com muita dificuldade essa discussão.”

Fonte: Valor Econômico. Por Anaïs Fernandes e Hugo Passarelli

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