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Brasil ‘não pode cometer erros com a China’, diz estudioso

Sonia Racy – 10 de setembro de 2019 | 00h40

MARCOS VINICIUS DE FREITAS.

Aliado a Trump, Bolsonaro precisa de boa estratégia em sua
visita à China em outubro, ‘para evitar uma retração dos investimentos chineses’ adverte Marcus Vinicius de Freitas, professor em Pequim

Depois de tudo o que disse e fez nos últimos oito meses, nas relações com Donald Trump, o presidente Jair Bolsonaro precisa ter “uma narrativa adequada” para as conversas que terá com os líderes chineses em Pequim na visita que fará à China em outubro. Quem faz a advertência é Marcus Vinicius de Freitas, ligado à Faap e visiting professor na Universidade de Relações Exteriores de Pequim, uma espécie de “berço de formação” dos diplomatas daquele país.

“O Brasil não pode perder a oportunidade de criar a base para uma relação com ganhos exponenciais”, adverte o professor. Em entrevista telefônica à coluna, da capital chinesa, ele pondera que não se pode correr o risco de provocar uma retração nas expectativas deles, “quando temos no horizonte grandes temas globais como inteligência artificial, propriedade intelectual e 5G”. É preciso “ganhar a confiança para aproveitar as oportunidades”.

O que esperar da visita de Bolsonaro a Pequim?

Que ela ajude a incentivar mais investimentos no Brasil e crie uma relação bilateral produtiva. Digo isso porque no início do governo o que se viu foi uma aproximação intensa com Donald Trump e se espalhou uma ideia de que a China estava comprando “o Brasil” e não “no Brasil”. Pareceu, aqui, que se queria criar um entrave na relação. Ora, os chineses não querem ter “dois Trumps no mesmo continente”. Isso retraiu a perspectiva de investimentos de longo prazo.

Qual o tamanho real desse estrago?

Tudo depende do alinhamento que se dará daqui por diante. O Brasil tem de deixar claro para eles qual é sua relação com os EUA e quais os seus interesses na China. Se tentar boicotá-la, por exemplo, na questão da inteligência comercial e do 5G, vai desestimular investimentos e compras do seu grande cliente.

Mas eles se interessam pelos produtos brasileiros, não?

Sim, mas há uma falsa percepção, no Brasil, de que somos os únicos fornecedores de certos produtos para os chineses. Não é verdade. O minério pode ser obtido na Austrália, a soja nos próprios EUA, por exemplo. E temos de tomar cuidado porque não agregamos valor às nossas commodities. Corremos o risco de ir ficando para trás nos avanços globais.

O que o sr. quer dizer com “ganhos exponenciais” que o Brasil poderia ter?
Basta olhar o futuro. A renda per capita chinesa hoje é de 10 mil dólares. O projeto deles é chegar a 25 mil ou 30 mil até 2050. O impacto disso é enorme. Como fornecedor, o Brasil pode encontrar aqui um poço infindável para o que vier a produzir.

Isso pressupõe uma estratégia de longo prazo.

Sim, e tem de levar em conta que a China vive uma transição de fábrica global para mercado consumidor global. Uma oportunidade que surge aí, por exemplo, é que o Brasil pode ser um “hub” a partir do qual a China produza para exportar para outros mercados, ao mesmo tempo em que se transforma num grande mercado consumidor para eles.

Quando o sr. fala em “narrativa adequada” para os encontros entre Bolsonaro e os governantes chineses, o que está sugerindo?

Uma atitude consequente, de olho no interesse do nosso país. Dou um pequeno exemplo: quando o general Hamilton Mourão esteve aqui em Pequim, em recente viagem, perguntou basicamente o que a China tem a oferecer. Acho isso equivocado. Eles é que têm o dinheiro e o mercado consumidor. Ou seja, nós é que devemos interessá-los no que temos a oferecer”. / GABRIEL MANZANO

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