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Para Toffoli, Lava Jato destruiu empresas e MP é pouco transparente

Presidente do STF elogia ‘áreas de excelência’ no governo Bolsonaro e afirma que arcabouço legal de combate à corrupção surgiu com decisão da Corte sobre mensalão

 

Quantos a gente já não pôs para fora no CNJ? Veja se o Conselho Nacional do Ministério Público fazia isso até pouco tempo. Judiciário trabalha com transparência” Ataques não são para me desacreditar. São para fazer com que as pessoas não acreditem em nenhuma instituição. Isso aí é a ruptura da democracia”

Para o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), José Antônio Dias Toffoli, “o Ministério Público deveria ser uma instituição mais transparente”. Em entrevista a Luiz Maklouf

Carvalho, ele afirmou que a Operação Lava Jato pôs o Brasil numa outra dimensão do ponto de vista do combate à corrupção, mas destruiu empresas.

“Isso jamais aconteceria nos Estados Unidos. Jamais aconteceu na Alemanha.” O ministro também disse que o governo do presidente Jair Bolsonaro “tem pessoas e áreas de excelência funcionando muito bem”. Sobre a polêmica a respeito do veto da Corte à prisão após condenação em segunda instância, lembrou que “o STF julgou o mensalão, condenou várias autoridades, vários empresários”. “Foi ali que começou todo esse trabalho de combate à corrupção e (tiveram início) os projetos de lei que levaram a esse arcabouço jurídico, às leis de combate ao crime organizado. O Supremo está firme no combate à corrupção. Não é uma decisão que faz cumprir a Constituição que vai surtir efeito numa percepção quanto à corrupção.”

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro José Antônio Dias Toffoli, disse ao Estado em entrevista na sexta-feira passada que o governo do presidente Jair Bolsonaro “tem pessoas e áreas de excelência funcionando muito bem”. Não quis dizer quais são, mas reiterou: “São áreas de excelência, têm feito belíssimos trabalhos, têm tido diálogos com as instituições o tempo todo”.

Com 52 anos, há 10 na Corte e há 15 meses na presidência, o paulista de Marília, ex-advogado e integrante do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que o indicou ao posto, com referendo do Senado, recebeu o Estado na enorme sala de audiências contígua ao seu gabinete no terceiro andar do STF, com ampla vista para o Palácio do Planalto. Aproveitando a costumeira informalidade da sexta-feira, estava sem gravata e sem meias. Uma tosse chata o incomodava de vez em quando – “esse ar condicionado acaba matando a gente”, disse, a tantas, mandando desligar. Tinha um leve ar de cansaço – que explicou como resultado de 18 horas de trabalho por dia. “Estou doido pra descansar”, afirmou.

Em quase duas horas de entrevista, numa histórica mesa de madeira, oval, de 12 lugares, Dias Toffoli falou do presidente e do governo Bolsonaro; disse que “o Ministério Público deveria ser uma instituição mais transparente (mais informações na pág. A8)” – como entende que o Judiciário o seja –, e que “a Lava Jato destruiu empresas – o que jamais aconteceria nos Estados Unidos, por exemplo”.

Comentou, também, os momentosos e recentes julgamentos que agitaram o Supremo, como aquele em que deu o voto decisivo para proibir a prisão depois da sentença de segunda instância. A decisão possibilitou a saída do ex-presidente Lula

da prisão em que estava há quase dois anos, condenado na Operação Lava Jato. Sobre o Coaf (rebatizado de Unidade de Inteligência Financeira), no qual seu voto foi criticado como difícil de entender – “precisa de um professor de javanês”, disse o ministro Luís Roberto Barroso – Dias Toffoli afirmou que foi um voto “elogiadíssimo”. Comentou, também, o repto que deu em Barroso, durante sessão do plenário, dizendo “respeite seus colegas”.

Na quinta-feira, em mais uma lembrança dos piores momentos da ditadura, o presidente Jair Bolsonaro disse que mandaria ao pau de arara um ministro que descobrisse ser corrupto. O que o sr. acha desse tipo de declaração do presidente, de resto recorrente?

É evidente que a responsabilidade de um cargo impõe uma ritualística mais rigorosa para o uso de determinadas expressões. São manifestações que devem ser mais comedidas e mais pensadas.

O que o sr. acha do presidente Bolsonaro?

Ele tem um discurso permanente para a base que o elegeu, mas ele tem uma capacidade de diálogo também. É uma pessoa que muitas vezes é julgado pelo que ele fala, mas ele tem, no governo, pessoas e áreas de excelência funcionando muito bem. Não vou dizer quais são, porque aí vou estar dizendo quais não estão indo bem. Mas são áreas de excelência, têm feito belíssimos trabalhos, têm tido diálogos com as instituições o tempo todo. A impressão, curiosamente, é que é um governo com aquela mensagem mais isolada, mais sectária para determinado segmento da sociedade, e não um governo de todos. Mas, no dia a dia, políticas públicas estão sendo desenvolvidas, como na área de infraestrutura. Na área da economia tem sido sempre feito um amplo diálogo com o parlamento. E aqui mesmo no Supremo.

Por exemplo…

Agora mesmo fizemos uma reunião extremamente importante a respeito dos acordos de leniência (com as empresas processadas na operação Lava Jato ). Porque a Advocacia-Geral da União entende de um jeito, o TCU de outro, o Cade de outro, o CVM de outro, o MP de outro. Cada um acha que os acordos realizados têm que ter mais alguma coisa. Quem é que pode arbitrar? Eu chamei uma reunião aqui. Já criamos um grupo de trabalho, um comitê executivo, para criar e ter uma solução efetiva até o final de março, para dar segurança jurídica.

Explique melhor…

A Lava Jato foi muito importante, desvendou casos de corrupção, colocou pessoas na cadeia, colocou o Brasil numa outra dimensão do ponto de vista do combate à corrupção, não há dúvida. Mas destruiu empresas. Isso jamais aconteceria nos Estados Unidos. Jamais aconteceu na Alemanha. Nos Estados Unidos tem empresário com prisão perpétua, porque lá é possível, mas a empresa dele sobreviveu. A nossa legislação funcionou bem para a colaboração premiada da pessoa física. Mas a da pessoa jurídica não ficou clara. Então nós criamos um comitê interinstitucional para dar uma solução para esse problema. Muitas vezes o Judiciário pode ter essa função extrajudicial. Pela respeitabilidade, pode ser um árbitro para proposições e solução de problemas.

Foi um ano tenso, não?

O Brasil vinha de governos de centro e centro-esquerda. E mudou para um governo de direita. Então houve, depois da redemocratização, uma primeira vitória da direita com o apoio da extrema-direita.

Como o sr. entendeu essa mudança?

Como um cansaço da população seja com corrupção, seja com pessoas que a população já não queria mais ver como seus representantes. E com a ideia de uma vontade de destravar o Estado, superar a burocracia estatal. Essa foi a mensagem que foi levada e aceita pelas urnas. Então, em primeiro lugar, tem que se respeitar a vontade popular.

O julgamento mais importante do ano foi o que acabou, por apertada maioria, com a prisão depois de decisão da segunda instância. O sr. esteve no centro da roda, levando tiro de todo lado, virou até boneco nas manifestações. A questão poderia não ter sido votada até hoje – ou até o sr. sair da presidência. Por que o sr. a colocou na pauta?

Era um tema que já estava liberado para a pauta pelo relator, ministro Marco Aurélio, há muito tempo. E tanto o ministro Marco Aurélio quanto o ministro Celso de Mello estão já próximos da aposentadoria – e pediam para mim que isso fosse a julgamento para terem a possibilidade de votar. A outra questão é a pacificação social. Grande parcela da sociedade gostaria de ver isso julgado, embora outra parcela não quisesse. E a nossa função é julgar. Então foi julgado.

Como o sr. administrou a tensão e os ataques?

Se dizia, de um lado, que viria um grande caos, uma tensão na sociedade, que as ruas iam ser tomadas, que as cadeias iam ser abertas. E aí se verificou e se verifica que nada disso aconteceu. Ou seja: era muito mais espuma do que qualquer outra coisa. E, pelo contrário, parece que se deu uma serenidade, inclusive com o Parlamento assumindo as suas competências do ponto de vista de eventual solução normativa para o tema.

Fonte: O Estado de S. Paulo | 16 Dec 2019 | Luiz Maklouf Carvalho

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