PAPER 85: Projeto de País (EU SOU BRASIL!!!)
“O teste de um estadista é saber detectar, no torvelinho das decisões táticas, os interesses de longo prazo de seu país e inventar estratégia adequada para consegui-los”
Henri Kissenger
Tema: “Representação e Democracia”
Na preciosa dissertação do prof. Marco Aurélio Nogueira, a seguir, de abrangência mundial, são tratados neste “PAPER” o papel da representação, estrutura fundamental na democracia, na questão Política e nas Entidades de Classe do Sistema Produtivo Brasileiro.
Eficácia é fazer o certo; eficiência é fazer bem feito o certo; e representatividade é o exercício da representação com eficácia e eficiência.
A turbulência pela qual passa o mundo, não é privilégio do Brasil, reservou à pandemia o papel de acelerador do processo que vinha se desenvolvendo, no qual a representatividade ocupa o papel central, num mundo tão populoso.
(…) “O arranjo socioeconômico, institucional, cultural é outro. A começar da família, que modelou até hoje a sociedade. Nossos filhos adotam novos formatos de vida familiar, de casamento, vivem juntos de maneira distinta, são felizes ou infelizes de um modo todo deles.
A mesma coisa na economia. Damos como óbvio que todos querem empregos estáveis, longas carreiras em empresas sólidas, rotinas estabelecidas, carteira assinada. Seria a receita contra a “precarização”, um remédio para valorizar o trabalho e os trabalhadores. Não sabemos se é isso mesmo que as pessoas querem. Talvez não seja a expressão do desejável para as novas gerações, mais chegadas ao improviso, à excitação do movimento, da velocidade. Também ignoramos se tal cenário é factível num mundo de tecnologias onipresentes e mudanças aceleradas. E as empresas, por sua vez, têm dificuldades para se reposicionar no mercado e reformular plantas e procedimentos.
Dá-se algo parecido na política. É quase impossível admitir que os partidos voltarão a ser o que foram no século 20, estruturas burocráticas, pesadas, focadas na conquista e no controle do poder, com dirigentes que se eternizam no cargo. A democracia está posta como valor, inquestionável para a maior parte dos humanos. Mas os sistemas democráticos estão em crise, são chantageados e corrompidos por líderes e movimentos fundamentalistas, que se querem “patrióticos”, mas minam sistematicamente as bases da Nação e do Estado.
A vida mudou, arrastando consigo as imagens que tínhamos do futuro. Diante de nós se abrem uma interrogação, muitas distopias e nenhuma utopia.” (…)
(…) “A ordem geral é sempre sobreviver. Não é por acaso que tanto se valoriza o aqui e agora, o que pode ser minimamente “apalpado”, é menos incerto e duvidoso.” (…)
(…) “Para sobreviver com dignidade precisamos manter a lucidez e a serenidade, combinando-as com a indignação que nos faz recusar injustiças, nos mobiliza e nos ajuda a manter a esperança e a grandeza de espírito. Essas são nossas estrelas-guia.”
São trechos do brilhante artigo “O futuro que nos escapa”, do Dr. Marco Aurélio Nogueira, professor titular de Teoria Política da UNESP, Estadão, 27/06/2020, pág. A2, de leitura necessária do inteiro teor, disponível no Blog, que em poucas palavras nos põe diante da vida, hoje.
No Brasil, na ausência de Partidos Políticos estruturados, que deveriam dar consistência a uma mínima organização da sociedade, iniciou-se pelas jornadas de 2013 uma série de manifestações de rua, algumas muito grandes e ocorridas em várias cidades.
As manifestações não traziam claros os temas propostos ou reivindicações populares dos diversos grupos, exceto um deles que propunha a intervenção militar como instrumento para responder à insatisfação manifestada, tendo o Brasil optado pelo regime democrático, em plena formação, carente de aperfeiçoamentos e fortalecimento.
O “establishment” político fez “ouvidos moucos” àqueles movimentos ao conduzir o País a mais uma eleição geral em 2014. Na sequência, a história política é do conhecimento dos contemporâneos.
Na eleição de 2018, fato inteiramente imprevisível, elegeu-se o candidato a presidente da República “outsider” ao “establishment” que, dentre argumentos e apoios, trazia no bojo do processo da campanha eleitoral um nebuloso e simulado apoio militar.
Fato notório foi que os novos governantes não tinham um plano de governo, razão pela qual limitaram-se a tentar demonstrar que o País estava melhor que com os antecessores, e foi-se desenvolvendo o movimento que reivindicava intervenção militar, com agressões visíveis às instituições constituídas, a que o presidente em diversas ocasiões e maneiras foi se expondo, inclusive incorrendo em possíveis violações constitucionais; quando dele mediante juramento de posse dever-se-iam esperar aperfeiçoamentos no regime democrático.
Já estávamos com doze meses de mandato, em meio a um governo sem um plano claro e objetivo de recuperação da economia, que vinha em crise desde maio/2014. A campanha eleitoral oferecera argumentos por renovação de métodos na política, contentando-se a jogar com recursos de marketing político e publicidade. Em resumo, o que mais se evidenciou politicamente foi o fator militar na política brasileira.
Diante desse cenário político, com prejuízo para a sociedade, que já se cansava da sua sujeição à crise econômica, com os efeitos sociais inaceitáveis de há muito, o professor aposentado da Academia da Força Aérea Sr. Antonio Carlos Will Ludwig se pronunciou pelo artigo “Os militares e o presidente”, divulgado pelo Estadão em 21/03/2020,página A2, integrante do“PAPER”77de 23/04/2020.
Nesse artigo o pronunciamento foi de que a perturbação política estava se dando pela conduta do presidente e pela presença de militares em diversos ministérios e mais de dois mil em escalões inferiores; e que o presidente, em seus gestos e alusões tentava mostrar para a sociedade, e para os meios políticos em particular, que contava com apoio incondicional dos militares para sua gestão. Desconsiderou, intencionalmente ou não, seu papel de representação do povo brasileiro decorrente do processo eleitoral democrático recente. O professor Ludwig, referindo-se aos militares, sugeriu que a “saída deles do governo enquadraria Bolsonaro nas exigências da vida política democrática.”
Em 04/05/2020, Estadão, página A2, o professor Antonio Carlos Will Ludwig (*) voltou a público pela divulgação do artigo que transcrevemos na íntegra a seguir:
“O presidente, os militares e a democracia”
“Ministério da Defesa deveria ter condenado manifestação por AI-5 e intervenção militar
Os meios de comunicação já registraram e continuam registrando uma das condutas mais frequentes exibidas pelo atual presidente da República, qual seja, seu descaso pelo regime democrático. Com efeito, eles já exibiram suas manifestações de enaltecimento do período ditatorial, de intimidação dos jornalistas e de admiração a um militar comprometido com a tortura.
A mais recente aconteceu em frente a um quartel do Exército, onde discursou perante um grupo de seguidores que propunham a intervenção dos militares, a edição de um novo AI-5 e o fechamento do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional.
O episódio revelou a existência de posições diferentes assumidas pelos militares. Um grupo se mostrou totalmente contra, porquanto tal evento serviu para provocar mais a ira dos parlamentares e dos membros do Judiciário, constituiu uma provocação desnecessária, aconteceu em local inapropriado, mostrou-se negativo para a imagem das Forças Armadas e expôs uma gravidade simbólica pelo fato de que o presidente é o seu comandante. O grupo instalado no governo considerou natural a braveza do presidente, uma vez que o Parlamento tem cerceado as iniciativas presidenciais e o Supremo Tribunal Federal favoreceu os governadores e prefeitos no combate à pandemia.
Por sua vez, o ministro da Defesa, respaldado pelos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, emitiu uma nota em que destaca apenas que as Forças Armadas obedecem incondicionalmente à Constituição federal e que no momento elas se encontram bastante empenhadas no combate ao coronavírus.
Note-se que o conjunto dos discordantes não teve a preocupação de fazer uma vigorosa condenação a um movimento atentatório ao regime democrático. Os palacianos, apesar de em várias ocasiões terem contribuído para moderar a conduta do presidente, além de não o desaprovarem, mostraram-se condescendentes, pois o consideram refratário a qualquer ruptura da ordem democrática. Observe-se que essa atitude pode ser interpretada como uma licença para ele continuar cometendo atos reprováveis. O comunicado do Ministério da Defesa traz um conteúdo aligeirado e inclinado para o lado da indiferença, porquanto nem faz referência à manifestação daquele domingo.
Esse comunicado faz lembrar a ordem do dia pertinente ao 31 de março, a qual expõe que aquele movimento foi um marco para a democracia brasileira porque se constituiu numa reação às ameaças que pairavam sobre ela. Destarte contém a postura de defesa do regime democrático, a qual não é visualizada no comunicado mencionado. Considerando que nossa Constituição atribui às Forças Armadas a defesa da democracia, o comunicado poderia ter lembrado o evento e exibido uma clara e indubitável posição a favor dela.
O alvitre de não incluir as duas propostas provavelmente se deve ao anseio de firmar uma posição de neutralidade das Forças Armadas perante os eventos políticos. Essa suposição também encontra ressonância na ordem do dia relativa ao citado Movimento de 31 de março, pois nela se encontra registrado que as Forças Armadas visam apenas o cumprimento de sua missão constitucional. Ressalte-se que a tentativa de solidificar uma postura indeterminada pode gerar a interpretação entre os civis de que as instituições castrenses estão aprovando as manifestações contra os Poderes constituídos.
A opção pela neutralidade não se revela apropriada, uma vez que é praticamente impossível sustentá-la porque se baseia num pressuposto bastante efêmero. O comportamento neutro é uma das questões mais difíceis e controversas postas para a ciência e a filosofia resolverem. E pelo que se sabe até o momento, não foi produzida nenhuma resposta consistente para ela.
Há ainda um complicador relacionado à nossa História, o qual se mostra como um obstáculo muito poderoso. Durante várias décadas, desde a Proclamação da República, o destino do País manteve-se intimamente atrelado aos quartéis. Foi governado por soldados durante um bom tempo e atualmente um servidor fardado da reserva se encontra no comando da Nação, após uma acirrada campanha eleitoral que envolveu muitos militares, dentre os quais alguns se encontram ocupando os principais cargos do governo.
Considerando que ainda não emergiu uma solução coerente viabilizadora da atitude de neutralidade, que a pretensão de tentar garantir a neutralidade das Forças Armadas não se coaduna com seu papel constitucional e que o apego à ideia de neutralidade dos estabelecimentos castrenses tende a contribuir para alimentar a desconfiança dos paisanos em relação aos militares, é possível inferir que o Ministério da Defesa deveria ter citado e condenado a manifestação, bem como recomendado ao Judiciário a abertura de um processo investigatório para identificar seus organizadores e financiadores.
(*) PROFESSOR APOSENTADO DA ACADEMIA DA FORÇA AÉREA, PÓS-DOUTOR EM EDUCAÇÃO PELA USP, É AUTOR DE ‘DEMOCRACIA E ENSINO MILITAR’ E ‘A REFORMA DO ENSINO MÉDIO E A FORMAÇÃO PARA A CIDADANIA’.
No artigo “Relações entre civis e militares”, no Estadão, 23/06/2020, página A2, o embaixador Rubens Barbosa, assim conclui: (…) “Militares em funções políticas de ministros e altos funcionários do governo observam seguidamente que as atitudes políticas de militares com postos no governo são de lealdade e não podem ser confundidas com a postura isenta das Forças Armadas como instituições de Estado. É do vice-presidente, militar da reserva, a afirmação de que ‘precisa acabar essa história de que as FFAA estão metidas na política’.
Essas afirmações seriam corroboradas pelo silêncio dos comandantes das três Forças, militares profissionais em função no Ministério da Defesa. Para encerrar de vez esse capítulo seria importante que os comandantes das três Forças se manifestem publicamente, dissociando-as de demonstrações contra as instituições, caso venham a se repetir. Com isso ficaria claro o não envolvimento da instituição na política interna e seu total respeito à Constituição.”
Outros eventos:
“Generais criticam presença de oficiais da ativa no governo”
“Entendimento nas três forças é que o escolhido – como Ramos e Pazuello – deve ir para reserva ao assumir cargo civil”. Tânia Monteiro, jornalista, O Estado de S. Paulo, 22 de junho de 2020
“STF e Forças abrem diálogo em busca de pacificação”
“Desgaste do ministro da Defesa fez o Supremo buscar diálogo com o Comando do Exército; comandantes das Forças buscam ficar distantes da radicalização bolsonarista”. Tânia Monteiro, jornalista, O Estado de S. Paulo, 22 de junho de 2020
“Discursos contra presidente marcam ato suprapartidário”
“Em debate organizado pelo movimento ‘Direitos Já’, Ciro, Marina e FHC defendem consenso entre adversários”. Pedro Venceslau e Marilia Sabino, jornalistas, O Estado de S. Paulo – 27 jun 2020
O que foi acima argumentado, inclusive as três reportagens, evidencia a perda de tempo, energia de trabalho, produção de animosidades desnecessárias, quando constitucional e institucionalmente as funções estão definidas, e se não estão precisam ser definidas. Pois todos temos de estar atuantes em funções produtivas, cada um na sua competência para vencer as crises da pandemia e a econômica que a todos preocupa e afeta; nossa eficácia e eficiência estão deixando a desejar, na representação do povo. Ou são nossos diplomas constitucionais e legais que não estão permitindo à representação desempenho satisfatório em relação às nossas necessidades.
É oportuno o artigo “Serenidade e responsabilidade”, do Sr. Leandro Miranda, responsável pela Ágora Investimentos e diretor-executivo do Bradesco, homem do mercado financeiro, no Estadão de 15/06/2020, página B7, que transcrevemos o trecho parcial a seguir:
(…) “Estamos enfrentando dados incongruentes ou até mesmo ausência deles, oportunistas políticos e parte significativa da mídia que não olham para o bem-estar social, não querem mostrar nenhum lado positivo, nem trazer esperança, mas, sim, em como aproveitar esta situação para desestabilizar o status quo e criar pânico não só na nossa sociedade mas no mundo todo, trazendo desalento para a sociedade, afastando investidores e deprimindo o preço dos nossos ativos, deixando nossos governantes com um medo paralisante de cortes, com dificuldade de diálogo e incapacidade de liderança e gestão. Que vergonha. Quanta falta de patriotismo. Quanta falta de seriedade. Quanta incompetência.
E agora? O que devemos fazer? “Back to basics.” Voltemos aos fundamentos.(…)
(…)Trabalhe de forma séria e dedicada. E, acima de tudo, mantenha a serenidade. Vai acabar tudo bem. A história nos mostra isso. É uma fase, mas ela tem que ser levada a sério. Mas, como fazer isso?
Planeje como um oriental, não importa o tempo que leve. Execute como um germânico, com atenção e seriedade em cada detalhe, em cada fase do percurso, levando o tempo necessário para executar o que foi planejado à risca. E, depois, faça marketing dos resultados como um norte-americano. Mas, mantenha serenidade. Tudo tem seu tempo.”
As manifestações acima são enfáticas, claras e devem ser ouvidas pelas autoridades e lideranças, em se tratando de um regime democrático e no Estado de Direito, em que a representação é estrutura fundamental. É imperioso que haja ordem e harmonia, eficácia e eficiência no cumprimento constitucional e institucional por todos os três poderes e entes federativos da República, e pela sociedade como um todo, para que se consiga, nas condições peculiares do Brasil, atravessarmos essa situação inusitada. Essas desorganizações e voluntarismos, oriundos de ineficácia e ineficiência só prejudicam.
É indispensável que todos, os dirigentes públicos, os líderes em geral, e os cidadãos comportem-se como estadistas no que respeitam às responsabilidades e comprometimento que todos temos de ter. Não há lugar para espertezas, quando lidamos com escassez de competências. “Cada macaco no seu galho”, e segure o galho (já é bastante, se for bem feito).
Nosso País tem se atrasado cada vez mais em relação aos países mais desenvolvidos. Agora é oportunidade de rara significação para articularmos a União Nacional, presidida pelo bem comum e o interesse nacional, simples, com humildade, grandeza, determinação, coragem, e demais virtudes em que a jornada implica. Cada um olhar para dentro de si, e todos para dentro do País para encontrar o que fazer: mudar.
As mudanças têm de ocorrer, como já se movimentam empresários, a exemplo do engenheiro José Ricardo Roriz Coelho, vice-presidente da FIESP e presidente da Abiplast (Associação Brasileira da Indústria do Plástico), em artigo intitulado “A hora da mudança chegou!”, Folha de São Paulo, 10/06/2020. É iniciativa que deve ser apreciada, valorizada e seguida por todas as Federações coirmãs, estaduais e a nacional, visto o quanto a recuperação econômica precisará das Federações e dos empresários, ativos, altivos e independentes; em especial os da Indústria, visto seu papel a desempenhar na economia exportadora, que preconizamos para o Brasil.
“Para buscar uma sintonia fina com os anseios democráticos do Brasil, a Federação e o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp) precisam mudar.
A pandemia impõe transformações drásticas na sociedade. As mudanças de hábito, que resultam do cumprimento dos protocolos de distanciamento social, exigem um grau de adaptação que certamente será em grande parte mantido quando a doença estiver controlada. O impacto das alterações nas relações de trabalho será duradouro. O home office, as reuniões virtuais, a coordenação remota de empreitadas, a valorização dos serviços de delivery, tudo isso são sementes de um novo mundo, ainda não totalmente conhecido, que está ganhando forma.
Talvez a transmutação mais importante seja a dos valores. A desaceleração da economia, cujo aspecto perverso é mais evidente, também despolui rios e mares, limpa o ar, reduz o número de acidentes, levando as pessoas a repensar o próprio estilo de vida. O consumidor pós-pandemia será mais consciente, mais sensível a questões ambientais e sociais. A indústria, a partir de iniciativas individuais, tem contribuído para essa sociedade nascente. Basta observar as doações que têm sido feitas, não obstante as empresas terem sido afetadas diretamente pela adversidade decorrente da pandemia.
Noto, no entanto, que há um grande descompasso entre as ações humanitárias patrocinadas pela iniciativa privada e o comportamento de avestruz de algumas lideranças que supostamente a representam. Há, entre elas, quem se recuse a ver o óbvio. Com a cabeça enfiada no solo das ambições pessoais, não enxergam a gravidade da crise, da mesma maneira que são incapazes de identificar as mudanças em curso.
Se a indústria, por meio de suas lideranças, não se conectar a uma sociedade em evolução, pagará o alto preço de ser deixada para trás. O anacronismo é pecado mortal. A defasagem de percepções entre a indústria e o país condenaria o setor à irrelevância, esta antessala escura e sinistra da derrocada. A indústria precisa se posicionar como interlocutora qualificada. Precisa ser ouvida e respeitada por empresários de outros setores, pelas três esferas de governos, pela sociedade como um todo. Mas não é isso, infelizmente, o que tem acontecido em São Paulo, justamente o Estado onde, historicamente, o setor mais se desenvolveu.
Alguns podem julgar que eu estaria pregando a divisão da representação da indústria. Pois é exatamente o contrário: ao atrair empresários que se afastaram, estou buscando a convergência.
Uma entidade empresarial de respeito não pode ser usada como joguete, como escada de aspirações estranhas a seus representados. Não pode ser manipulada por políticos nem diminuída em sua essência. Tal comportamento não faz jus ao papel da indústria. Cerca de 27% dos investimentos feitos no país têm origem na indústria. Dois terços da atividade de inovação empresarial (67%) são de responsabilidade da indústria. O setor precisa fazer valer a agenda de impulsionar as condições de competitividade, precisa continuar gerando empregos de qualidade, com salários dignos, cuidar de seus interesses de classe. Precisa, enfim, numa palavra, mudar.
Mudar porque as fronteiras entre indústria, comércio e serviços deixaram de ser claras. Mudar porque o processo de integração da indústria nacional a internacional é irreversível, e precisamos estar preparados e competitivos para isso.
Mudar porque a sobrevivência da indústria depende, de um lado, de sua modernização, de sua atualização tecnológica e, do outro, da alteração das condições do ambiente regulatório em que está inserida.
Mudar porque o próprio sistema de representação empresarial precisa ser redefinido e São Paulo deve ter posição de liderança neste processo. Mudar porque a governança da Fiesp/Ciesp precisa se adaptar aos novos tempos, com regras rígidas de “compliance”, limitação de mandatos e renovação periódica de suas lideranças.
Mudar porque uma grande parcela das lideranças industriais ignora a Fiesp e migrou para as associações setoriais, que tem feito um excelente trabalho! Mudar porque a Fiesp é uma instituição que precisa ser revigorada e passar a representar não correntes de opinião política, mas sim todos os industriais da capital e do interior de São Paulo, de todos os setores da indústria e de todos os tamanhos.”
E não é só: esse movimento de legitimar as lideranças deve se alastrar, até as Associações Comerciais, Câmaras de Dirigentes Lojistas, Associações de Profissionais Liberais, Clubes de Serviços, Sindicatos Patronais e de Empregados, Universidades, Colégios, Instituições Religiosas, Entidades Sociais. As lideranças dessas Instituições deverão restabelecer o papel legítimo e autêntico da representatividade das Entidades de Classe, apoiadas na eficácia e eficiência da representação, em todos os setores do sistema produtivo no Brasil, tão necessárias para o movimento das transformações reclamadas. Responder pela tarefa de mobilizar a sociedade, unida, marchando num só sentido e direção para ter a energia e a força, necessárias visando a superação concomitante das duas crises, a sanitária e a econômica, mas também, simultaneamente construir novos padrões de como SER, na melhor nação do mundo para se viver bem.
Essa iniciativa da sociedade, de união e ação, haverá de contagiar as lideranças das instituições públicas governamentais, para buscar aprimoramento da representação política, regida pelos eficazes e eficientes instrumentos, que são o voto distrital puro e o “recall”, e assim vencer a paralisia – o mais perigoso inimigo agora, nessa guerra.
“As perspectivas são desfavoráveis, mas a missão não é impossível. Dependerá de quem assumir a liderança. O êxito não resultará de medidas de força, mas da inteligência, perseverança, visão e capacidade de coordenar esforços dos responsáveis pela reconstrução”. (Almir Pazzianotto, ex-ministro do Trabalho e ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho, em artigo “A reconstrução” Estadão 20/05/2020, página A2)
A democracia fundada no Estado de Direito e na cidadania não é uma estação de chegada, mas uma maneira de viajar, visando desenvolvimento econômico, político, cultural e social para transformar o Brasil na melhor nação do mundo para se viver bem.